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terça-feira, 19 de dezembro de 2017

HOMO SAPIENS: UM ASSASSINO EM SÉRIE


[...] A megafauna da Nova Zelândia – que sobrevivera mudança climática de cerca de 45 mil anos atrás sem um único arranhão – sofreu golpes devastadores imediatamente depois que os primeiros humanos puseram os pés nas ilhas. Os maoris, os primeiros colonizadores sapiens da Nova Zelândia, chegaram às ilhas há cerca de 800 anos. Em poucos séculos, a maior parte da megafauna local foi extinta, junto com 60% de todas as espécies de pássaros.

Um destino similar acometeu a população de mamutes da ilha de Wrangel, no oceano Ártico (200 quilômetros ao norte da costa siberiana). Os mamutes prosperaram por milhões de anos na maior parte do hemisfério norte, mas, quando o Homo sapiens se espalhou – primeiro pela Eurásia e depois pela América do Norte –, eles recuaram. Há 10 mil anos, não havia um único mamute a ser encontrado no mundo, exceto em algumas poucas ilhas remotas no Ártico, mais notadamente na de Wrangel. Os mamutes de Wrangel continuaram a prosperar por mais alguns milênios e então desapareceram de maneira abrupta há cerca de 4 mil anos, justo quando os primeiros humanos chegaram à ilha [...]

 [...] O povoamento da América não ocorreu sem derramamento de sangue. Deixou para trás um longo rastro de vítimas. A fauna americana há 14 mil anos era muito mais rica do que hoje. Quando os primeiros americanos marcharam rumo ao sul, do Alasca para as planícies do Canadá e o oeste dos Estados Unidos, encontraram mamutes e mastodontes, roedores do tamanho de ursos, rebanhos de cavalos e de camelos, leões gigantes e dezenas de espécies grandes que são completamente desconhecidas em nossos dias, entre as quais os temíveis tigresdentes- de-sabre e as preguiças-gigantes, que chegavam a pesar 8 toneladas e podiam ter até 6 metros de altura. A América do Sul abrigava uma coleção ainda mais exótica de grandes mamíferos, répteis e aves. As Américas eram um grande laboratório de experimentação evolutiva, um lugar em que animais e plantas desconhecidos na África e na Ásia haviam evoluído e prosperado.

Mas não mais. Dois mil anos após a chegada dos sapiens, a maioria dessas espécies singulares havia desaparecido. De acordo com as estimativas atuais, nesse curto intervalo a América do Norte perdeu 34 de seus 47 gêneros de grandes mamíferos. A América do Sul perdeu 50 de 60. Os tigres-dentes-de-sabre, depois de florescer por mais de 30 milhões de anos, desapareceram, tal como as preguiças-gigantes, os leões-americanos, os cavalos e camelos nativos do continente, os roedores gigantes e os mamutes. Milhares de espécies de mamíferos menores, répteis, aves e até mesmo insetos e parasitas também se extinguiram (quando os mamutes morreram, todas as espécies de carrapatos de mamute tiveram o mesmo destino).


Se a extinção australiana e americana fosse um acontecimento isolado, poderíamos conceder aos humanos o benefício da dúvida. Mas o registro histórico faz o Homo sapiens parecer um assassino em série da ecologia.

FONTE:


HARARI, Yuval Noah. Sapiens: uma breve história da humanidade. Tradução Janaína Marcoantonio. 11 ed. Porto Alegre, RS: L&PM, 2016. PG. 76 -77.

domingo, 15 de abril de 2012

Titanic: o que podemos aprender

Por Douglas Barraqui

Há cem anos atrás a natureza demonstrou ao homem a sua força implacável e colossal. Um simples bloco de gelo, obra da mãe natureza, colocaria em baixo da água, e não em cima dela, uma das maiores obras da engenharia humana: o RMS Titanic.

O Titanic foi fruto de uma sociedade industrial, de um período de cultura cosmopolita da sociedade europeia, momento de avanços tecnológicos que mudariam o mundo a exemplo do telegrafo, o telefone sem fio, o cinema, a bicicleta, o automóvel e o avião. Inventos que inspiravam no homem uma nova percepção a mercê da realidade: era a Belle Époque, bela época em francês.

Essa mesma sociedade do início do século XX devastava a natureza de modo atroz e voraz. Era o preço do luxo, das praticidades e comodidades da bela época.

Concebido para ser inafundável” dizia um folheto publicado em 1910 da White Star Line empresa operadora do navio. Com quase 50.000 toneladas de aço e 270 metros de comprimento o Titanic era o maior navio de passageiros do mundo. Resultado das mais avançadas tecnologias disponíveis na época.

Mas o que parecia impossível aconteceu: na noite do domingo do dia 14 de abril de 1912, por volta das 23:40 o Titanic se chocaria com um bloco de gelo a deriva no oceano, afundando na manha do dia seguinte. De 2.240 pessoas a bordo o naufrágio vitimou, nas gélidas águas do Atlântico Norte, 1.523 pessoas.

Foi um grande choque para a sociedade daquela época. Apesar do que havia de melhor de tecnologia e de uma experiente tripulação, o inafundável Titanic não só afundou como levou a morte milhares de pessoas.

E o que podemos aprender com Titanic? Atualmente nossa sociedade industrializada, consumista e capitalista não estaria indo em rota de colisão com as forças desconhecidas da mãe natureza. Segundo relatório intitulado “A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade para Políticas Locais e Regionais”, as cidades atualmente ocupam um pouco mais de 2% da superfície da terra, e que mais da metade da população mundial vive nelas e que, de forma alarmante, já consumimos mais de 70% dos recursos naturais disponíveis em nosso planeta.

Assim como o Titanic não era inafundável, nós não somos inatingíveis. Temos que superar o “paradigma da imunidade humana” (human exemptionalism paradigm) aos fatos naturais, como nos fala José Augusto Drummond. Não estaríamos, todos nós, a bordo de um grande barco em uma trágica rota de colisão com nosso passado de séculos de espoliação desenfreada dos recursos naturais de nosso planeta? Teremos o mesmo fim trágico daqueles abordo do Titanic?

Referência:

DRUMMOND, José  Augusto. A história ambiental: temas, fontes e linhas de pesquisas. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, Vol. 4 n. 8, 1991, Pg. 179. 

Relatório intitulado "A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade para Políticas Locais e Regionais" (Teeb, na sigla em inglês), lançado no Brasil em 9 de setembro de 2010, em workshop realizado em Curitiba, no Paraná. Disponível em http://www.teebweb.org/Portals/25/TEEB%20Synthesis/TEEB_Sintese-Portugues_web[1].pdf. Acesso em 15 de abril de 2012.