segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Entre mortos e feridos: fim do maior julgamento do STF


Por Douglas Barraqui

“Na melhor das hipóteses, Lula, o senhor é um idiota. Na melhor. Na pior, o senhor é um corrupto.” (Arthur Virgílio, líder do PSDB no Senado)

“O PT desconhece esse assunto, nunca ouvi falar sobre ele, portanto nós estamos repudiando esse tipo de acusação conta o PT.” (Presidente nacional do PT, José Genoino)

“Eu vi que o governo agiu para isolar o PTB. Vai ter que sangrar a cabeça de alguém na guilhotina, tem que haver carne e sangue aos chacais.”” (deputado Roberto Jefferson)

“Ele está tentando se fazer de vítima, mas é preciso lembrar que ele é reú. Ele é réu nesse caso.” (deputado José Dirceu sobre Roberto Jefferson)

“Zé Dirceu, se você não sair daí rápido, vai fazer réu um homem bom.” (deputado Roberto Jefferson, em depoimento ao Conselho de Ética)

“Nós dilapidamos o nosso capital moral perante a sociedade.” (Tarso Genro, presidente nacional do PT)

“Eu tenho medo, pânico, do José Dirceu. Ele é um homem sem coração.” (deputado Roberto Jefferson)

“Nós dilapidamos o nosso capital moral perante a sociedade.” (Tarso Genro, presidente nacional do PT)

“Não organizei, não sou chefe, jamais participaria da compra de votos de parlamentares.” (José Dirceu, deputado do PT e ex-ministro da Casa Civil)

“O que ela quer são cinco minutos de fama.” (Valdemar Costa Neto, presidente do PL, em respostas às denúncias que a ex-mulher fez dizendo que ele usava indevidamente o dinheiro do partido)

“Se eu tivesse um buraco para me meter entraria nele para sempre.” (Marcos Valério, empresário e avalista do PT)

“O PT é um navio que foi atingido, está prestes a afundar e se recusa a jogar a carne podre fora para ficar mais leve.” (Jefferson Perez, senador do PDT-AM)

“O Zé [Dirceu] deu um soco na mesa: O Delúbio está errado. Eu falei para não fazer.” (deputado Roberto Jefferson, sobre a reação do então ministro da Casa Civil quando foi alertado do mensalão)

“Mentira, canalha, safado!” (Severino Cavalcanti, presidente da Câmara, ao desmentir o empresário que havia confessado tê-lo subornado)

“Respeito à ingenuidade. Não sei, no entanto, de onde imaginavam que o dinheiro viria - se do céu, num carro puxado por renas e conduzido por um senhor vestido de vermelho.” (Delúbio Soares)

“'A direita está fazendo com o PT o que a ditadura militar fez com João Goulart e o que fez no passado com Getúlio e JK.” (José Dirceu, deputado do PT e ex-ministro da Casa Civil)

“O que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil sistematicamente.”” (presidente Luiz Inácio Lula da Silva)

Foram quatro meses de julgamento, 53 sessões, 37 réus, destes 25 foram condenados e apenas 11 cumpriram inicialmente o regime fechado. Entre mortos e feridos acabou o maior julgamento da história do Supremo Tribunal Federal (STF).

Historicamente falando o que podemos aprender desse acontecimento atípico da história, marcada por corrupção, de nosso país? Talvez possamos passar à acreditar que há heróis em nosso país como o caso de Joaquim Barbosa, atual presidente do STF, o primeiro negro a sentar na cadeira do STF, nosso “homem da capa preta” – como rolou nas redes sociais – foi comparado ao justiceiro de Gotham City. Muitos querem Barbosa para presidente. Posso dizer que ele fez o seu trabalho, e nada mais; por sinal muito bem feito, como nunca tinha sido feito na história do Brasil.

O PT estava na linha de tiro. Lula, “o filho do Brasil”, quem para muitos representou a última esperança de um povo, sobreviveu. Mas cá entre nós, foi blindado, protegido, isolado e, muito provavelmente, terminará como herói de guerra.José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil; José Genoino, ex-presidente do PT; Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT; José Roberto Salgado, José Borba, ex-deputado (ex-PMDB-PR); ex-diretor do Banco Rural; Deputado João Paulo Cunha (PT-SP); Marcos Valério, empresário e publicitário; Cristiano de Mello Paz, ex-sócio de Marcos Valério; Ramon Hollerbach, ex-sócio de Marcos Valério; Henrique Pizzolato, ex-diretor do Banco do Brasil; Rogério Tolentino, advogado e ex-sócio de Marcos Valério; Simone Vasconcelos, ex-gerente da SMP&B; Vinícius Samarane, vice-presidente do Banco Rural; Kátia Rabello, ex-presidente do Banco Rural; Deputado Valdemar Costa Neto (PL-SP); Jacinto Lamas, ex-tesoureiro do PL; Pedro Corrêa, deputado cassado (PP-PE); João Cláudio Genú, ex-assessor do PP na Câmara; Romeu Queiroz, ex-deputado (PTB-MG); Carlos Alberto Rodrigues, ex-deputado (PL-RJ); Enivaldo Quadrado, ex-sócio da corretora Bônus-Banval; Breno Fischberg, ex-sócio da Bônus-Banval; Emerson Palmieri, ex-tesoureiro do PTB; Pedro Henry (PP-MT) e, finalmente, Roberto Jefferson, deputado cassado (PTB-RJ) aquele que jogou a merda no ventilador; e agora, após o Mensalão do PT, eu pergunto: como ficará o mensalão do PMDB que desviou 18 milhões da prefeitura do Rio; o mensalão do DEM, envolvendo o ex-governador José Roberto Arruda e outras 36 pessoas em um esquema de corrupção desarticulado pela Operação Caixa de Pandora; e o mensalão dos “tucanos” no escândalo de peculato e lavagem de dinheiro que ocorreu na campanha para a eleição de Eduardo Azeredo.

O Mensalão está e esteve enraizado como um câncer nas entranhas da história de nosso país. A maracutaia de compra de votos, desvios de dinheiro, caixa dois entre outros devaneios políticos vergonhosamente sangram a imagem do Brasil. Você dirá meu leitor que queria mais – penas mais rigorosas, prisões de todos os envolvidos – mas, quero dizer que um passo foi dado, e é sinal de que algo está mudando no anacronismo do nosso legado de corruptos. Só espero que passos mais largos e mais vigorosos sejam feitos para que isso tenha um fim. 

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

O Humanismo Cívico em Baron e em Skinner

Por Douglas Barraqui

“Liberdade, igualdade, fraternidade, individualismo, racionalismo”; Os alicerces da nossa sociedade foram construídos sobre os valores renascentistas, estes por sua vez buscaram entre gregos e romanos sua inspiração. Um desse legados é o “Humanismo Cívico”. Neste breve texto iremos abordar dois autores e o debate que eles fazem a cerca do “Humanismo Cívico” ou “Republicanismo Clássico”: Quentin Skinner, historiador Britânico, e Hans Baron historiador alemão que pesquisou o pensamento político e literatura no Renascimento italiano - sua principal contribuição para a historiografia do período foi a introdução, em 1928, o termo humanismo cívico.

E o que seria o “Humanismo Cívico” ou, como preferem alguns autores, “Republicanismo Clássico”? é a doutrina segundo a qual a verdadeira natureza do homem se realiza no engajamento da vida política. Ele tende a ver a vida moderna como uma degeneração da vida humana, porque está concentrada demais nas idéias de interesse particular e felicidade individual. Para o “civista”, a verdadeira república é vivida onde os homens se entendem como cidadãos antes que como indivíduos, onde se consideram livres quando participam da tomada de decisões, e não quando são menos coagidos por elas. Trata-se, portanto, “de uma nova filosofia de engajamento político e da vida ativa”; pautada pelo exercício da prática da vida cívica (vida pública) e da valorização da vida ativa. Assim, o “Humanismo Cívico” ou “Republicanismo Clássico” passou a ser um modelo de interpretação da história do pensamento político moderno.

Trata-se de uma tese de Hans Baron, importante historiador do século XX. Para Baron Florença, no contexto do Renascimento, será o centro difusor da Itália e para o mundo do que Baron chamou de “Humanismo Cívico”. Para Baron o “Humanismo Cívico” é uma característica singular da Florença renascentista e que de Florença se irradiou para outros lugares.
Hans Baron

Baron considera que o desenvolvimento do “Humanismo Cívico” tem relação direta com a luta por “liberdade cívica” que os florentinos foram forçados a travar, na primeira metade do século XV, contra Giangaleazzo Visconti, o duque de Milão, quando este declarou guerra a Florença. E quando Giangaleazzo morre em 1402 pela peste – o que salvou Florença da derrota, considerado por alguns como milagre – seu filho, o duque Filippo Maria Visconti de Milão assumira os objetivos do pai. A guerra durou até 1454 quando Cosme de Médici consegue negociar a paz.

Os acontecimentos acima relatados foram utilizados por Baron para pontuar o surgimento do “Humanismo Cívico”. Para isso irá se utilizar de uma série de autores que discutiram as questões políticas em Florença no início do quatrocentos. A “postura solidária” que Florença tomou frente aos déspotas que ameaçavam a sua soberania é interpretada por Baron como catalisadora de uma nova consciência e mais intensa da vida pública: um novo tipo de humanismo pautado pela devoção das liberdades coletivas e uma nova política de engajamento da vida ativa política.

Em Baron o “Humanismo Cívico” é uma resposta a crise de Florença. Em meio a ameaça a independência de Florença irá ocorrer uma maior valorização dos valores republicanos. Basicamente uma relação de causa e efeito: ameaça a Florença/surgimento do “Humanismo Cívico”.

Quentin Skinner, historiador Britânico, não contesta ou questiona o “Humanismo Cívico”. O que ele pondera é que os valores do “Humanismo Cívico” – engajamento da vida política, a vida ativa e a defesa dos valores republicanos – não é algo exclusivo de Florença.
Quentin Skinner

Para Skinner o “Humanismo Cívico” já era embrionário nos surgimentos das Cidades Estados italianas no confronto com o Sacro Império no século XII e no conflito com os papas no século XIV. Neste contexto, ainda na Idade Média,  vários autores já conclamavam a defesa dos valores republicanos como justificativa ideológica para legitimar o enfrentamento dos adversários de Florença que ameaçavam a sua liberdade. Dentre eles Marsílio de Pádua, que em seu texto, “o defensor da paz”, defendeu o republicanismo e a soberania popular.
Skinner pontua também o que há de original e exclusivo em Florença quanto à caracterização do “Humanismo Cívico”:

  • Defesa da República como melhor forma de governo: Baron diz que Salutati havia sido o primeiro a afirmar a República como melhor forma de governo. Skinner por sua vez diz que tanto Bartolommeo quanto Marcílio já haviam feito isso.
  • Noção de liberdade republicana: relacionada desde Aristóteles a Rousseau a idéia de autogoverno e independência.
  • Faccionismo ou partidarismo: a este ponto desta Skinner que não foi dado grande importância por autores florentinos pois ali não havia conflitos de facções.
  • Riqueza excessiva: a República atua como limitadora da riqueza excessiva.
  • Tropas mercenárias: não aparece na literatura medieval mas, Leonardo Bruni irá condenar pois estes mercenários não lutavam pelos valores da República e sim pelo butin e/ou pelos seus soldos.
Assim podemos perceber que Baron não percebeu a relação entre o “Humanismo Cívico” florentino e as tradições medievais. Baron exaltou Florença e seu exclusivismo no surgimento dos valores do “Humanismo Cívico”, porém, Skinner vai nos dizer que estes valores surgem bem antes, ainda na Idade Média. Skinner ainda destaca o elemento de continuidade para contestar as idéias de Baron.

Podemos dizer que do “Humanismo Cívico” será feita uma releitura no século XVIII na  Revolução Inglesa e na Revolução Francesa. E que essa teoria é um marco no entendimento do pensamento político moderno. 

Referências:

SKINNER, Quentin. A formação do pensamento político moderno. São Paulo, Companhia das Letras, 1996.