sábado, 19 de setembro de 2009

Mais um pouco sobre História do Espírito Santo


Enaile Flauzina fez mestrado na Universidade Federal do Espírito Santo em 2008, com uma tese, simplesmente excepcional, sobre Política e Economia Mercantil nas Terras do Espírito Santo (1790 a 1821). Tido eu a oportunidade de ler essa obra, não pude deixar de fazer uma breve análise, que é o que se segue abaixo:


INTRODUÇÃO


Enaile da início ao seu trabalho apontando para a necessidade de pesquisas focalizando os mecanismos internos de produção econômica, e salienta a importância da micro história italiana, que será a jugular direcionadora de sua tese. Salienta ainda das necessidades essenciais das pesquisas de caráter regional, a fim de compreender as singularidades locais. No Espírito Santo, porém, a carência de pesquisas sobre a história da região, acaba por propiciar a adoção de modelos historiográficos generalizados.


A autora prima nesta Dissertação, por conhecer as estratégias de inserção dos diversos segmentos na dinâmica conjuntural da capitania. Tratando, portanto, de um estudo de diversos empreendimentos pessoais, que demonstram o estabelecimento de uma rede de relações sociais na constituição de outros horizontes para a região. A hipótese a ser tratada pela autora é da importância da Vila da Victoria (atual Ilha de Vitória) que não esteve alheia as populações circunvizinhas, funcionando como importante entreposto comercial e principal núcleo urbano.


Utilizando de fontes primárias de cunho cartorial e documentos oficiais: Memórias, catas, petições, etc. a autora dá ênfase ao pequeno comércio, à mobilidade social dos pardos e forros, aos mecanismos de exclusão social, às elites e suas estratégias de acumulação. A utilização da micro história, pretende, logo, diminuir os reducionismo predominantes nos atuais trabalhos acadêmicos.


A autora objetivou explicar, então: a) a relação entre a ocupação de cargos públicos; b)formas de produção e consumo predominante; c) padrões hierárquicos sociais da Vila de Victoria; d) posições sociais dos donos de negócios; e) participação do Espírito Santo no quadro do sistema colonial.


  1. ESPÍRITO SANTO: UMA DAS HISTÓRIAS DO BRASIL COLONIAL

1.1 – NO TEMPO DOS DONATÁRIOS


Enaile nos mostra que o empreendimento colonizador da terra não se demonstrou muito tranquilo, devido à hostilidade indígena. E que a presença dos jesuítas foi determinante na doutrinação dos povos gentios e que os religiosos também exerceram forte influência na política e com considerável participação econômica.


A produção agrícola era diversificada: algodão, tabaco, criação de gado bovino; o que não impediu a crise, a partir de 1620, devido os constantes ataques indígenas e o descaso da Metrópole, durante a União Ibérica. Todavia a autora ressalta que neste período foi estabelecido na capitania, em 1621, um importante comércio de escravos.


Em 1627, morre o último membro da família de Vasco Fernandes Coutinho, o donatário Francisco Aguiar Coutinho. A partir de 1643, uma nova crise se instaura, mediante ao governo exercido por capitães mores. Em 1674, A capitania é vendida a Francisco Gil de Araújo que, incentivou a agricultura, construiu fortalezas e igrejas e incentivou a vinda de colonos. Após sua morte assumiria seu filho Manoel Garcia Pimentel e deu-se início a nova crise econômica.


1.2 – MEU DONO A COROA: O ESPÍRITO SANTO COMO CAPITANIA RÉGIA


No início do século XVIII a capitania do Espírito Santo é resgatada pela Coroa Portuguesa, parte de uma articulação para transformar as capitanias hereditárias em capitanias reais. Na segunda metade do século XVIII, nos mostra a autora, a capitania estaria subordinada ao Governo da Bahia. E com a crise aurífera no século XVIII, a coroa demonstrou interesse em dar novo impulso à capitania.


Concernente a proibição de transito no interior do Espírito, Santo durante 33 anos [1] transformou-se a capitania em uma espécie de barreira verde contra possíveis contrabandos de ouro das Minas Gerais, não significando, entretanto, o isolamento daquela região, ou mesmo, de toda a extensão da Capitania capixaba, sua faixa litorânea permaneceu habitada durante todo período colonial.


1.3 – O ADVENTO DO SÉCULO XIX NO ESPÍRITO SANTO


Final do século XVIII e início do XIX, novas perspectivas ressurgem a fim de tornar a capitania mais produtiva e lucrativa para a coroa. Silva Pontes, o então governador, providenciou a abertura do Rio Doce a navegação, buscou-se também reavivar a navegação direta com Portugal.


Nomeado em 1812, Francisco Alberto Rubim da Fonseca e Sá Pereira, constituiu-se o primeiro governante independente da Bahia, este chega a ser parabenizado pelo príncipe D. João VI, pela atitude e atenção da administração da capitania. Abriu estradas, desenvolveu lavouras, incentivou a mineração, aos estudos de aplicação de navegação nos demais rios Ca capitania, construção da Casa da Misericórdia, e aterros no sentido de urbanizar a Vila de Victoria. O ultimo governante antes da proclamação da independência do Brasil, foi Baltazar de Souza Botelho de Vasconcelos, que tomou posse em 1820, e deu prosseguimento a política do antecessor. Após a independência foi eleito pelas juntas o primeiro presidente da província Ignacio Accioli de Vasconcellos.


A autora problematiza que a principal preocupação dos governadores nomeados para a capitania, nas primeiras décadas do século XIX, era de descobrir novas fontes de riquezas para a manutenção da monarquia.


1.4 – MEMÓRIAS: A CONSTRUÇÃO DISCURSIVA DA ECONOMIA


Após análise de documentos oficiais, das primeiras décadas de 1800, Enaile conclui que: alguns descrevem a capitania com uma riqueza exuberante, o caso de Simão de Vasconcelos, o príncipe Maximiliano Wied Neuwied e o naturalista Augusto Saint-Hilare [2]. Outros por sua vez, demonstrar claro pessimismo como o caso do escrivão da Junta Real, Francisco Manoel da Cunha. A agricultura confirma ser a principal atividade produtiva capixaba, com lavouras de cana de açúcar, mandioca, algodão, milho, arroz, feijão e tendo inicio do cultivo do café.


A propósito da população, permite a identificação de alguns profissionais liberais estabelecidos na Vila de Victoria: cirurgiões, boticários, professores e negociantes, além de funcionários públicos.


O comércio, diz a autora, era composto, principalmente, de gêneros que faltavam na capitania: farinha de trigo, carne seca, bacalhau, azeite, vinho, vinagre, sal, queijo, louça. Portanto, a exportação de viveres e o abastecimento de gêneros importados foram fundamentais para a manutenção positiva da economia e, a diversificação da produção continuaria subseqüente à independência do Brasil.


  1. REDES MERCANTIS DO ESPÍRITO SANTO (1790 A 1821)

2.1 – NOVOS TEMPOS PARA A CAPITANIA CAPIXABA


O processo de mudança administrativa colonial, com início e no termino de setecentos, acabou por ocasionar significativas alterações socioeconômicas para o Espírito Santo. Pode-se concluir, nos diz Enaile, que a capitania afigurou-se como participe do sistema colonial no que se refere às relações mercantis.


Em 1808, a população da Vila de Victoria era relativamente reduzida, limitando os grandes empreendimentos. A solução encontrada pelos comerciantes foi a de estabelecer relações sociais que ultrapassava os mecanismos mercantis de compra e venda de mercadoria, o que envolvia: estratégias arriscadas de conceder e adquirir empréstimos.


2.2 – TODOS NEGOCIAM, TODOS VIVEM E TODOS SE SUSTENTAM


Todavia a situação vivenciada pelo Espírito Santo, naquela época, não destoava muito das demais capitanias; os negociantes agiam como responsáveis pelo grosso da comercialização, no abastecimento interno e externo e, até mesmo, no incremento da produção agrícola, adquirindo propriedades, não só urbanas como rurais. Havia, nos fala a autora, uma estreita ligação entre o mundo rural e o urbano.


A respeito das atividades exercidas na Vila de Victoria, após levantamento de inventários: comerciantes, profissionais (advogados, médicos, etc.) e indivíduos que dependiam do soldo (militares). A riqueza estava acumulada nas mãos de uns poucos privilegiados; das nove maiores fortunas, quatro tinham como fonte de renda os negócios, duas dizem respeitos a comerciantes estabelecidos na Vila de Victoria e, três tinham renda principal no âmbito rural. A maior parte da população estava ligada a terra, e acabava por viabilizar seu sustento com o trabalho na lavoura para abastecimento local e também para comerciar.


2.3 – NEGOCIANTES NA PRAÇA MERCANTIL DA VILA DA VICTORIA


A Vila de Victoria permanecia nos anos que antecederam a independência como sede da única comarca da capitania, funcionando como importante entreposto comercial em que as redes sociais se demonstravam mais nítidas. Para tanto, Enaile traça um imprescindível histórico, com base em inventários e outros documentos, da trajetória de homens como: o negociante Matheus Jose Vieira; o capitão mor Jose Ribeiro Pinto; negociante Manoel Antonio Borges Madeira; o comerciante itinerante Francisco José Vieira de Sá; o alferes Jose Joaquim Barboza; Joaquim de Carvalho, natural de Lisboa; João Nunez Pereira. Diante das trajetórias dos homens dedicados aos negócios, seja na praça da Victoria, seja em outras capitanias – Rio de Janeiro, Pernambuco e Bahia – nota-se que, em princípios do século XIX, já estava estabelecida a elite mercantil capixaba e os mecanismos garantidores do escoamento dos gêneros da terra e do abastecimento da população com artigos de fora. A concessão de crédito acabou por produzir uma forma de consolidar as relações sociais entre a elite local e o restante da população.


2.4 – SECOS E MOLHADOS: O COMÉRCIO NA VILA


As populações das freguesias – Serra, Cariacica, Vila Velha, etc. – freqüentavam a Vila de Victoria como forma de suprir a necessidade de consumo e vender a produção. Enaile nos mostra que, entre 1790 a 1821, as escravarias se apresentavam como principal fração arrolada nos espólios de período referenciado. Seja como for, independente das distinções regionais, a colonização brasileira teve um predomínio na faixa litorânea, com os núcleos urbanos dividindo espaço com as lavouras. A elite econômica, por meio de benesses e alianças, acabou por conseguir também, firmar-se como elite política.


  1. DOS ENGENHOS À PRODUÇÃO DE ALIMENTOS

3.1 – PRESTÍGIO E FORTUNA NAS MÃOS DE POUCOS


Era na agricultura que a força de trabalho escrava, sua maior parte, era empregada. A fim de expandir a produção, do açúcar, ainda em 1814, Francisco Alberto Rubim, concedia terrenos por sesmarias dentro do Espírito Santo. Sobre a presença de engenhos e engenhocas: haviam em terras capixabas 60 engenhos e 66 produtores de aguardente.


Analisando, portanto, alguns cidadãos da nobreza local dedicados à produção dos fatores que permitiam a manutenção do poder, a partir de prestígio e da riqueza acumulada pela terra, Enaile destaca: Francisco Pinto Homem de Azevedo, dedicado a vida pública e do fazendeiro Ignácio Pereira Barcellos conclui-se que, o consumo de produtos mais requintados acabava por celebrar a posição social das famílias tradicionais e ligadas à elite local; muita das vezes com estreita ligação com a produção rural, expressando uma correlação e dependência entre, a manutenção patrimonial e o prestígio social. No período colonial, nos mostra a autora, a diversificação da renda servia como forma de manutenção e ampliação das fortunas e a terra era um importante símbolo de poder perante a sociedade.


Outros exemplos como o caso da viúva Clara Maria; João Pereira de Jesus; Raphael Maxado Fraga e do capitão Manoel Nunes Ribeiro nos permite levantar a possibilidade dos baixos investimentos corresponderem a uma produção de açúcar quase artesanal e com retorno insuficiente, exigindo dos senhores de pequenos engenhos, outras fontes de rendas, como lavouras diversas e criação de gado. Outros nomes como Manoel Ferreira dos Passos, Antonio Pinto Rangel, das informações colidas, percebe-se que seguiam um padrão estabelecido na colônia, numa escala reduzida, conformes as posses do contexto local; o que nos permite concluir que, as atividades subjacentes dos fazendeiros estavam vinculadas ao patrimônio imobiliário; dos senhores de engenho ao gado e; os donos de alambique e engenhoca associavam a produção de aguardente, com os roçados de alimentos e algodão.


3.2 – PRUÇÃO DE ALIMENTOS: LONGE E PERTO DO CENTRO


A visão historiográfica tradicional acabou por dar preferência, demasiada, aos produtos a serem exportados é então que, Enaile traçará um novo aspecto: no Espírito Santo, a criação de animais e plantação, se deram, predominantemente na faixa litorânea e, somente no século XIX, ocorreu uma interiorização e com ela a expansão da lavoura. A dificuldade de expansão territorial para o interior se dava devido à proibição régia e/ou ataques indígenas; ou pela dificuldade em se manter a cultura açucareira devido à instabilidade.


A autora destaca que em determinados inventários não constavam lavouras, mas, propriedades como roça ou sítio, bem como, ferramentas (machados, foices, enxadas etc.). Permitindo concluir que há existência de trabalhadores à meia em propriedade de terceiros.


Ao comparar os inventários de roceiros com menos fortunas com outras atividades (comércio, engenho, etc.), Enaile chega a conclusão que, a base de bens produtivos acabou por serem semelhantes com a presença quase constante das rodas de rolar mandioca, machados, foices, enxadas, canoas e carros de bois.


Quanto ao rebanho, estava totalmente empregado na capitania, seja na alimentação, ou no trabalho dos engenhos e transporte de mercadorias. A pecuária destacava-se como atividade ou subsidiária às outras formas produtivas.


3.3 – DE ESCRAVO A SINHÔ


Com relação aos escravos, estes constituíam a principal mão de obra, no então período estudado, contudo, inseridos em uma rede de relações que extrapola sua condição de cativo. Encontramos cativos como consumidores, devedores, profissionais especializados e mantendo relações familiares, ou seja, bens com participação nas relações sociais. O escravo constituía uma importante riqueza com seu uso da mão de obra em todos os setores da sociedade capixaba.


A autora ressalta que havia escassez de cativos, motivada devido a manutenção das exportações de escravo para a colônia espanhola na América e, outro fator reclamado pelo governador Silva Pontes, a respeito ao ato de libertar escravos em testamentos. Salientava Pontes que, à presença destes forros no âmbito urbano, dedicados à “revenda de frutos da terra”, prática sem controle que não gerava ganhos para a Fazenda Real. Era notória a existência de escravos com profissão demonstrando haver uma hierarquia entre o grupo social de cativos, o que também gerava sua conseqüente valorização e até mesmo possibilidade de agaranhar recursos para comprar alforria.


A autora observou também, a concessão de crédito, nas lojas de secos e molhados, para escravos efetuarem compras a prazo e que assumiam, em alguns momentos, a condição de devedores, adquirindo empréstimos com homens livres. A maioria dos escravos era crioula, ou seja, nascidos na colônia. Havendo um equilíbrio entre os sexos da escravaria capixaba. Tais informações identificam, nos diz Enaile, a produção em cativeiro, que uma longa historiografia brasileira persiste em negar tal prática.


Quanto ao senhor, seu papel seria o de conceder e reconhecer a família escrava, mantendo seus membros juntos, o que também propiciava o aumento do seu patrimônio. A presença de mestiço, nos diz Enaile, configurava o estabelecimento de relações afetivas entre cativos e homens livres no Espírito Santo; na lógica da época os bens mais preciosos seriam os cativos, sendo por isso sua posse sinônimo de status social. A autora salienta ainda que, tão logo deixavam à escravidão, os libertos usavam de mecanismos de adquirir escravos para ascender socialmente.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


Por fim a autora aponta que a pesquisa empírica acabou por revelar uma história do Espírito Santo colonial ímpar, no entanto, não apartada do contexto geral da colônia. As dificuldades e desafio estiveram na falta de uma bibliografia capixaba que viesse a servir de embasamento, também aponta ressalta a autora.


Notório é a constatação da autora de que a capitania do Espírito Santo, por não compartilhar da estrutura agroexportadora e que passou a ser considerada uma região periférica ao sistema colonial imposto pela metrópole portuguesa.


Destaque para a importância da Vila de Victória no que tange ao estabelecimento das relações mercantis da capitania, importante entreposto comercial, tanto para venda de produtos importados, quanto a negócios envolvendo a produção e a concessão de empréstimos aos moradores das regiões adjacentes.


Em suma, a autora aponta para o Espírito Santo, no contexto colonial, possuidor de uma realidade distinta das demais capitanias, mas que coadunava, com as estruturas impostas pela administração lusitana.


NOTAS:

[1] Antonio Rodrigues Arzão, em 1693, descobre ouro na capitania e sob a resolução do rei D. João V, proibiu-se a exploração do interior, a abertura de estradas.

[2] Mais sobre visitantes estrangeiros no Espírito Santo ver obra de Levy Rocha: Visitantes Estrangeiros no Espírito Santo.


BIBLIOGRAFIA:

CARVALHO, Enaile Flauzina . Política e economia mercantil nas terras do Espírito Santo (1791 – 1821). Dissertação de mestrado. Programa de Pós-Graduação em História Local as Relações Políticas. Universidade Federal do Espírito Santo. 2008. 160 p.

domingo, 6 de setembro de 2009

Da História Ambiental à Consciência Ecológica


Por Douglas Barraqui

O futuro nunca dependeu tanto do presente como agora. Embora, já na década de 1960 o meio ambiente tomava seu espaço na agenda política de vários países, em nenhum outro momento os alarmes tocados pelas entidades ligadas ao meio ambiente e por cientistas se fizeram tanto ouvir.

As provas empíricas de uma realidade atroz, a de uma crise ambiental em proporções catastróficas, estão por todas as partes, é neste aspecto que as ciências humanas e naturais são desafiadas a provar seu valor e justificar suas eficiências enquanto ramos da produção do conhecimento humano.

Após a segunda Grande Guerra, houve um gradativo crescimento da sociedade de consumo na América do Norte e na Europa, fazendo com que aumentasse a pressão sobre os recursos naturais do planeta; os debates ambientais passam ser calorosos e surgem novos paradigmas. Como uma disciplina na qual seu objeto é o homem, e mais precisamente os homens no tempo [1], a historiografia era desafiada a enfrentar um novo problema, novas abordagens e novas questões. Eis que surge, no âmbito científico e acadêmico Norte Americano, a environmental history (história ambiental): “como um sujeito, é o estudo de como os seres humanos têm relacionado, com mundo natural através do tempo; como um método, é a aplicação de princípios ecológicos para a história” [2]; “sua principal meta é aprofundar nossa compreensão de como os seres humanos têm sido afetados pelo seu ambiente natural através do tempo e, inversamente, como eles têm afetado o ambiente e com que resultados” [3].

O problema epistemológico da história não pode ficar resumido a um problema intelectual e científico, há algo mais além que, agora mais do que nunca, o historiador será provado e terá que enfrentar: um problema cívico e mesmo moral, o historiador tem que prestar contas [4]. É fundamental, portanto, compreender onde se dá a aplicação prática da história ambiental a fim de identificar e dissolver os gargalos que limitam seu espaço de atuação. Para tanto, a iniciativa terá que partir do próprio homem, aquele que não deixa o passado ser esquecido. O historiador terá que engolir qualquer orgulho acadêmico ou de formação teórica, suplantar qualquer forma de “pré-conceito” na troca do saber entre outros ramos da produção do conhecimento e olhar para o meio ambiente – seu meio ambiente – como sua base de existência e o limite do fim da história.

O objetivo em questão é colocar a natureza de volta aos estudos históricos, condicionalmente, explorar as formas pelas quais o mundo biofísico tem influenciado o curso da história da humanidade e as formas, assim como os porquês, que as pessoas têm transformado o seu meio [5]. Na qualidade de pesquisador elenco pontos que, em nossa conjuntura histórica de emergência para uma tomada de ação, são valorosos para o campo da história ambiental: 1) reconhecer a importância e necessidade de um olhar que caminhe pela interdisciplinaridade, promovendo o envolvimento entre as disciplinas, respeitando e reconhecendo suas respectivas fronteiras, caminhando na direção da interação a fim de ampliar o campo de visão da história. 2) fomentar a crescente interação internacional – tendo em vista que as problemáticas referente a meio ambiente tem que ser assistidas por todos os países – das ciências humanas e sociais através da cooperação entre os centros de pesquisas. 3) aproximar os problemas, os resultados e as soluções aos receptores – que não podem ser vistos como passivos do conhecimento alheio – afim de que possam interagir no processo que depende de todos a fim de uma maior consciência ecológica.

Não é mais contra a natureza que devemos lutar – até século XIX as formas e corpos naturais eram encaradas puramente como empecilhos a ocupação humana – mas, sim em sua defesa. A adoção de uma “paradigma de imunidade humana” (human exemptionalism paradigm) aos fatores da natureza, podem ajudar a explicar o motivo da antipatia das ciências sociais – desde suas origens – quanto a um “despertar ecológico” [6]. Seria, portanto, uma ignorância confinar e limitar as ciências sociais às pesquisas básicas e, um crime, em longo prazo ignorar sua contribuição, em um momento em que uma revolução na sensibilidade humana é tão necessária.

Avançar nas concepções das relações homem/natureza constitui uma tarefa difícil, mas de extrema necessidade. A história ambiental não pode ser encarada, portanto, como um mero movimento ambientalista no ceio da historia, um modismo passageiro e, tão pouco como uma história do ambientalismo. Em uma aplicação prática é denuncia pública? Sim, mas é também um ramo de produção do conhecimento com fundamentais reflexões e embates filosóficos e historiográficos. O que está em jogo não é a sobrevivência da história ou um simples esforço para ampliar o campo de narrativa da historiografia, mas sim, a sobrevivência da humanidade e do planeta.

NOTAS:

[1] BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2002. Pg. 24.

[2] HUGHES, J. Donald. Ecology and Development as Narrative Themes of World History. Environmental History Review 19:1-16 (Spring 1995) Pan's Travail, London, 1994. Pg. 3

[3] WORSTER, Donald. Ed. The Ends of the Earth: Perspectives on Modern Environmental History. Cambridge; New York: CambridgeUniversity Press, 1988. Pg. 290-291.

[4] BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2002. Pg. 17.

[5] WORSTER, Donald. "Path Across the Levee”, In: The Wealth of Nature. Environmental History and the Ecological Imagination (Oxford, 1993), p. 20.

[6] DRUMMOND, José Augusto. A história ambiental: temas, fontes e linhas de pesquisa. Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/84.pdf. Acesso em 5 agosto de 2009.

BIBLIOGRAFIAS:

BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2002.

DRUMMOND, José Augusto. A história ambiental: temas, fontes e linhas de pesquisa. Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/84.pdf. Acesso em 5 agosto de 2009.

HUGHES, J. Donald. Ecology and Development as Narrative Themes of World History. Environmental History Review 19:1-16 (Spring 1995) Pan's Travail, London, 1994.

WORSTER, Donald. Ed. The Ends of the Earth: Perspectives on Modern Environmental History. Cambridge; New York: CambridgeUniversity Press, 1988.

WORSTER, Donald. "Path Across the Levee”, In: The Wealth of Nature. Environmental History and the Ecological Imagination (Oxford, 1993).



Você também pode ter acesso a este artigo na Rede Brasileira de História Ambiental (RBHA) e em minha página História Ambiental.