Por Douglas Barraqui
Há algo que me dá muito
orgulho, ser professor de história. E ser professor de história no mundo em que
vivemos, no hoje, no mundo dos meus alunos. Eu, enquanto filho do meu tempo, estou me referindo a um
mundo sem uma forma definida, por vezes sem coesão e coerência,
um mundo do superficial do passageiro e onde existem mais incertezas do que
certezas, um mundo onde os nossos valores escorrem por ralos e vielas do
individualismo.
Em sala de aula quando, em
meio a debates históricos, me pego conversando com meus alunos sobre meu
passado, eles se espantam quando falo que na minha infância TV não tinha
controle remoto e celular não existia. E quando falo que não existia, e nunca imaginaria
que um dia viesse a existir, facebook, twitter e instagram, meus alunos se compadecem
de mim, sentem pena de mim e da minha infância que, na visão dos meus alunos,
devia ter sido muito difícil, horrível.
Esse mundo, que tem como
programa básico o individualismo, das redes sociais, todos são eminentemente
felizes. Todos compartilham sua felicidade intensa pelas redes sociais em fotos
lindas, perfeitas, maravilhosas. E se assim não forem usa-se fotoshop. Pelas redes
sociais tudo é belo, invejável e perfeito. Ninguém, absolutamente ninguém, vai
postar coisas do tipo “meu dia foi chato”.
Meus alunos não conhecem o
que é escrever uma carta e postar uma carta. Conhecem o que é um E-mail, enviar
um E-mail, ou mesmo, cutucar pelo facebook e chamar pelo “Zap Zap”. Não os culpo, tão pouco os descrimino. De tal forma, uma parte que noto na qualidade de historiador, é a primeira vez na história humana que os jovens detém e dominam a tecnologia. Isso é bom ou ruim, hora deixo previsões para o futuro para os especialistas em cartas de tarô.
Alguns podem até chegar à
seguinte conclusão: meu mundo, o mundo em que fui criado e formado, está
obsoleto. As mudanças ocorreram tão rapidamente, foram tão dinâmicas, que
referências de mundo se perderam.
Meus alunos nascem viciados
e dependentes de uma coisa chamada tecnologia, não que seja uma droga. Um reflexo disso está na escrita, meus alunos
não sabem escrever, por mais que eu ensine, eles não sabem. Por exemplo: o pronome
de tratamento real que, em Portugal, era “vossa mercê” (mercê significa graça,
concessão), foi se vulgarizando através dos séculos, transformado em suas
colônias, nas fazendas e nos meios mais coloquiais foi se “caipirizando”
(vossamecê, vossancê, voismecê, vancê) até chegar ao atual (e dentro da norma
culta, afinal a norma é clara, parafraseando um famoso árbitro-comentarista) “você”.
E agora chegou ao que considero o limite “VC”. Se caminharmos nesse ritmo alucinante
em dez anos “você” vai virar “C” – “’c’ fez a atividade de casa”.
Nas palavras do filósofo Francês
Jean Baudrillard “a revolução
contemporânea é a da incerteza”. Nossas certezas, não existem mais. As explicações
mudam e são descartadas muito rapidamente: até ontem eu acreditava que ovo e
banha de porco faziam mal a saúde, entupiam as veias. Vem a minha esposa - pela
rede social veja VC -, compartilha um vídeo comigo em que um médico e nutrólogo
– eu nem sabia que havia essa especialidade –, José Roberto Cater, explica que ovo
é o melhor e mais saudável alimento do mundo, só não tem vitamina C. E que
banha de porco é mais saudável do que óleo de cozinha vegetal.
Os jovens da nossa sociedade
cometem um erro comum e grotesco: achar que tudo que é novo é bom e tudo que é
velho é ruim. Ou, ao contrário, os velhos concebem tudo que é novo como ruim e
catastrófico e tudo que é velho como bom e idílico. Pois eu digo, nem um nem
outro. O velho não é melhor que o novo, o novo não é melhor que o velho, eles
apenas são diferentes. São cabeças diferentes, épocas diferentes e, para ser
mais técnico, trata-se de estruturas epistemológicas diferentes. Ser historiador me permite entender isso muito bem.