segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

O Portador de deficiência física e o direito ao trabalho


Ola caros amigos que acompanham a HiStO é HiStÓrIa. Minha amiga Diana Mazocco Lorenzon [1], futura advogada, concedeu-me a oportunidade de publicar o artigo de uma excepcional pesquisa de sua autoria sobre o portador de deficiência física. Dada a sua importância, como um meio relevante para promover a integração dos indivíduos na sociedade, a pesquisa realizada pela minha amiga Diana, investigou as causas da não eficácia da legislação tendente a propiciar o acesso de pessoas portadoras de deficiência física ao mercado de trabalho brasileiro, através de um levantamento bibliográfico relacionados ao tema. Devo ainda ressaltar a qualidade da pesquisa em termo historiográfico.

Por Diana Mazocco Lorenzon

INTRODUÇÃO

A lei brasileira, por estímulo constitucional, estabelece ação afirmativa categórica quanto à inserção das pessoas com deficiência no mercado de trabalho. [2] Por outro lado, a exclusão das pessoas com deficiência do convívio social ultrapassa séculos, revelando, até os dias atuais, o preconceito e a dificuldade de inserção desses indivíduos no mercado de trabalho.

Este trabalho tem como intuito investigar as causas da não eficácia da legislação tendente a propiciar o acesso de pessoas com deficiência física ao mercado de trabalho brasileiro. Para isso, será realizado um levantamento bibliográfico, utilizando-se a internet como importante ferramenta de busca de artigos relacionados ao tema, com a intenção de contextualizar o surgimento histórico das leis vigentes que garantem o acesso do deficiente físico no mercado de trabalho. Também vamos verificar os motivos da eficácia ou não das leis e da não efetividade do Estado em concretizá-las, além de expor sobre a capacitação profissional dos deficientes físicos para ingressarem no mercado de trabalho e, por fim, indicar sugestões para resolver a problemática.

EMBASAMENTO TEÓRICO

CONTEXTO HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO

O tratamento jurídico dado às pessoas portadoras de deficiência evoluiu a partir da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88), que prevê inúmeros instrumentos de proteção desses indivíduos. Embora o Brasil já tivesse ratificado a Convenção 159 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), foi a CF/88 que rompeu com os modelos assistencialistas até então operantes. Araújo [3] afirma que as leis daí decorrentes marcaram a descentralização da responsabilidade da inclusão dos portadores de deficiência e o Governo e a sociedade foram envolvidos nesse processo.

Entre os dispositivos da CF/88, destaca-se o art. 7°, XXXI, que preceitua que qualquer discriminação do trabalhador portador de deficiência no que diz respeito a critérios de admissão e salário é proibida. Tal dispositivo é de suma importância, já que passou a admitir o portador de deficiência como trabalhador. Já o art. 37, VIII, do texto constitucional, exigiu que lhes fosse reservado um percentual de cargos e empregos públicos.

Conforme Mendes et al. [4], para que tal direito se torne efetivo foi criada a reserva de mercado que consta na Lei 7.853/89, em seu art. 2°, parágrafo único, III, “d”. [5] regulamentação da referida lei pelo Decreto 3.298/99 possibilitou a concretização dos princípios constitucionais. Este Decreto foi ligeiramente alterado pelo Decreto 5.296/04, que inclui o cumprimento de cotas de portadores de deficiência que a empresa deve empregar.

Ainda com relação ao setor privado, a reserva de vagas para portadores de deficiência é garantida pela Lei 8.213/91, que fixa percentuais de vagas que devem ser preenchidas por beneficiários reabilitados ou pessoas habilitadas que tenham algum tipo de deficiência.

Neste diapasão, Fonseca [6] cita a Lei 8.112/90, que impõe que a União reserve, em seus concursos, até 20% das vagas a portadores de deficiências.

Quanto ao direito à profissionalização, primeiro passo importante para a inclusão do deficiente físico no mercado de trabalho, a Lei 11.180/05 possibilita a formação de contratos de aprendizagem com indivíduos portadores de deficiência, a partir dos 14 anos de idade. A referida lei estimula a parceria de empresas e organizações não governamentais que atendem pessoas com deficiência, tentando suprir as necessidades técnicas e profissionalizantes desses indivíduos, aliada a soma de suas atividades com as empresas.

Mesmo diante do reconhecimento do direito ao trabalho do portador de deficiência, o Brasil ainda não conseguiu resolver a problemática da capacitação desses indivíduos, a inclusão deles no mercado de trabalho de uma forma efetiva e a eliminação do preconceito que insiste em reinar desde épocas passadas.

EFICÁCIA DAS LEIS E EFETIVIDADE DE CONCRETIZAÇÃO POR PARTE DO ESTADO

Oliveira [7] afirma que:

Uma das inovações da CF/88 foi a positivação de valores inerentes à dignidade da pessoa humana, o que necessariamente são concretizados quando o Estado permite a seu cidadão a livre fruição de seus próprios potenciais.

Apesar do número crescente de contratações de portadores de deficiência e diante de várias leis que asseguram a sua inclusão no mercado de trabalho, o que se observa ainda é o descaso ou discriminação desses indivíduos.

Conforme Anache [8], não há como negar a existência de avanços na inclusão de sujeitos com deficiência no mercado de trabalho. Porém, a existência de legislações que asseguram tal direito ainda não é suficiente, já que as contratações são eventuais e nem sempre compatíveis com as potencialidades do portador de deficiência. Além disso, a autora faz críticas ao sistema de cotas, dizendo que a força de trabalho do portador de deficiência precisa ser conquistada por meio de seu emprenho próprio, pela sua competência, e não porque a legislação lhe reservou de um modo caritativo um percentual de vagas, que contribui para a propagação do estigma.

Para Fonseca [9], a reserva de vagas na Administração Pública ou nas empresas privadas trata da própria revelação do Direito do Trabalho, o qual nasce da premissa básica de que a lei deve assegurar a igualdade real entre as pessoas, suprindo as desigualdades que se constituam em fatores de segregação. A reserva de vagas não pode, portanto, ser considerada uma proteção paternalista.

Nas palavras de Ramalho [10], observa-se que a pequena participação do portador de deficiência no mercado de trabalho não decorre da falta de um sistema legal protetivo, mas sim da carência de ações, estímulos e instituições que viabilizem, de forma concreta, a formação, habilitação, reabilitação e inserção dos portadores de deficiência no mercado de trabalho.

Portanto, a dificuldade de inserção do portador de deficiência no mercado de trabalho, em se tratando de empresas do setor privado, se dá devido ao descrédito de suas capacidades por parte de empresários, por falta de adaptações ambientais e ergonômicas (o que geraria um custo adicional para a empresa), pela falta de incentivo ou apoio complementar ao cumprimento da cota (reserva de vagas estabelecida por lei) por parte do poder público e, por fim, pela falta de qualificação dos próprios portadores de deficiência.

O Estado tem papel importante no que se refere à habilitação do portador de deficiência para a sua inclusão no mercado formal de trabalho. A Lei 8.742/93, em conformidade com o art. 203, IV, CF/88, determina que um dos objetivos da assistência social é: a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária.” (art. 2°, IV). Já o art. 30 do Decreto 3.298/99 estabelece:

A pessoa portadora de deficiência, beneficiária ou não do Regime Geral de Previdência Social, tem direito às prestações de habilitação e reabilitação profissional para capacitar-se a obter trabalho, conservá-lo e progredir profissionalmente. [11]

Pode-se observar, portanto, que o Estado assumiu a responsabilidade cívica e a obrigação ética de desenvolver políticas públicas de proteção social destinadas a atender os portadores de deficiência. No setor privado, algumas instituições (que funcionam paralelamente ao Estado) desenvolvem programas bem sucedidos de habilitação de pessoas portadoras de deficiência para integração no mercado de trabalho, sendo de extrema importância os trabalhos realizados, que visam resgatar a cidadania desses indivíduos, tornando-os produtivos.

CAPACITAÇÃO PROFISSIONAL DOS DEFICIENTES FÍSICOS E SUGESTÕES PARA A RESOLUÇÃO DA PROBLEMÁTICA

O trabalho está relacionado à dignidade da pessoa humana. O acesso do portador de deficiência no mercado de trabalho implica em melhores condições de cidadania e, principalmente, de gozar da dignidade que lhes é inerte.

Nesse processo, a educação é um instrumento importante, já que quanto mais especializado for o indivíduo, maiores as chances de ser aceito no mercado de trabalho.

Muitos portadores de deficiência encontram vários obstáculos no dia a dia que dificultam o seu acesso à educação e especialização para o mercado de trabalho, como por exemplo, a dificuldade do acesso pelo transporte público ou pelas vias públicas (falta de rampas e corredores estreitos). E cabe ao Estado resolver essa parcela do problema, dando condições de acesso à educação ao portador de deficiência.

Savassi [12] afirma que a inserção e a retenção de portadores de necessidades especiais no mercado de trabalho dependem de três providências, a saber: preparo do portador de necessidades especiais, educação do empregador e disposição de boas políticas públicas. Além disso, sugere que:

Para enfrentar as dificuldades atuais de identificar e recrutar pessoas qualificadas, as empresas brasileiras terão de envolver-se com programas de educação e treinamento dos candidatos [...]. Esse mapeamento é fundamental para garantir a qualidade na execução da tarefa, a mobilidade e a segurança dos funcionários com deficiência. A contratação de funcionários, neste caso, pode precisar de uma atenção especial. O recrutamento precisa ser feito de forma mais ativa e cuidadosa [...]. A sensibilização de gestores e funcionários é outro ponto fundamental.

A Organização das Nações Unidas (ONU) também sugere algumas medidas de incentivo às empresas que contratam portadores de deficiência, visto que segundo a referida Organização, os portadores de deficiência ainda estão distantes da igualdade de oportunidade. Destacam-se as seguintes medidas: sistema de cotas com incentivo, isenções fiscais e aquisições preferenciais ou outras modalidades de assistência financeira. [13]

Ainda com relação ao setor privado, é necessário entender que não basta somente cumprir a lei. É necessário quebrar paradigmas e se envolver em programas de educação especial e profissional. A falta de conhecimento dos gestores com relação ao potencial profissional dos portadores de necessidades especiais é o que dificulta a incluir essas pessoas no mercado de trabalho. É preciso preparar não só as instalações da empresa, mas principalmente ensinar seus funcionários a se relacionarem de forma natural com os novos colaboradores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir do exposto, verifica-se que mesmo diante das evoluções com relação ao ordenamento jurídico voltado ao portador de deficiência, ainda não foi possível resolver a questão da sua inserção, de forma efetiva, no mercado de trabalho.

Leis são importantes sim, porém é necessário que o Estado fiscalize o cumprimento destas e que, principalmente, contribua para que elas realmente possam ser aplicadas, dando condições ao portador de deficiência de ter acesso à educação e capacitação profissional, para que ele se torne um profissional qualificado e seja admitido pelas empresas.

Ainda para a resolução da problemática, é fundamental que a sociedade e, principalmente, o empregador, ultrapasse o obstáculo do preconceito e se conscientize, verdadeiramente, que o portador de deficiência, no uso de suas aptidões que não dependam de suas limitações, é um ser produtivo e que deve ser respeitado.

NOTAS:

[1]. Discente do 5° período do Curso de Direito da Faculdade Novo Milênio.

[2]. FONSECA, Ricardo Tadeu Marques da. Os direitos humanos e a pessoa com deficiência no mercado de trabalho. Disponível em <http://www.calvo.pro.br/artigos/ricardo tadeu marques fonseca/ricardo tadeu direitos humanos.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

[3]. ARAÚJO, José Newton Garcia de. Pessoas com deficiência: entre exclusão, integração e inclusão no mundo do trabalho. Disponível em < http://www.abrapso.org.br/siteprincipal/anexos/AnaisXIVENA/conteudo/pdf/trabalho completo 21.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

[4]. MENDES, Beatriz et al. A pessoa portadora de deficiência e o direito ao trabalho no setor privado. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/pdfsGerados/artigos/321.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

[5]. Dispõe a Lei que órgãos e entidades da Administração Direta e Indireta devem dispensar tratamento prioritário e adequado em favor das pessoas portadoras de deficiência, no sentido de viabilizar a adoção de legislação específica que discipline a reserva de mercado de trabalho nas entidades da Administração Pública e no setor privado.

[6]. FONSECA, Ricardo Tadeu Marques da. O trabalho protegido do portador de deficiência. Disponível em <http://www.revistajustitia.com.br/artigos/14w07y.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

[7]. OLIVEIRA, André Luiz Pereira de. As ações afirmativas e o acesso dos deficientes ao mercado de trabalho brasileiro contemporâneo. Disponível em: <www.horizontecientifico.propp.ufu.br/.../getdoc.php?id...pdf> Acesso em 05 de novembro de 2009.

[8]. ANACHE, Alexandra Ayach. O deficiente e o mercado de trabalho: concessão ou conquista? Disponível em <http://www.marilia.unesp.br/abpee/homepageabpee04 06/artigos em pdf/revista4numero1pdf/r4 art10.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

[9. Idem nota 2.

[10. RAMALHO, Ednéia Cristina. Dificuldades na inclusão do deficiente físico no mercado de trabalho. Disponível em <http://www.revista.inf.br/contabeis08/pages/artigos/cc-edic08-anoIV-art03.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

[11. BRASIL. Decreto n° 3.298, de 20 de dezembro de 99. Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D3298.htm>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

[12]. SAVASSI, Márcia Villaça et al. A inclusão do portador de necessidades especiais (PNE’S) no mercado de trabalho. Disponível em < http://www.faminasbh.edu.br/bh/revistaeletronica/download/Volume2/art08.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

[13]. Idem nota 4.

BIBLIOGRAFIA:

ANACHE, Alexandra Ayach. O deficiente e o mercado de trabalho: concessão ou conquista? Disponível em <http://www.marilia.unesp.br/abpee/homepageabpee04 06/artigos em pdf/revista4numero1pdf/r4 art10.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

ARAÚJO, José Newton Garcia de. Pessoas com deficiência: entre exclusão, integração e inclusão no mundo do trabalho. Disponível em < http://www.abrapso.org.br/siteprincipal/anexos/AnaisXIVENA/conteudo/pdf/trabalho completo 21.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

BRASIL. Decreto n° 3.298, de 20 de dezembro de 99. Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D3298.htm>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

FONSECA, Ricardo Tadeu Marques da. O trabalho protegido do portador de deficiência. Disponível em <http://www.revistajustitia.com.br/artigos/14w07y.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

FONSECA, Ricardo Tadeu Marques da. Os direitos humanos e a pessoa com deficiência no mercado de trabalho. Disponível em <http://www.calvo.pro.br/artigos/ricardo tadeu marques fonseca/ricardo tadeu direitos humanos.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

MENDES, Beatriz et al. A pessoa portadora de deficiência e o direito ao trabalho no setor privado. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/pdfsGerados/artigos/321.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

OLIVEIRA, André Luiz Pereira de. As ações afirmativas e o acesso dos deficientes ao mercado de trabalho brasileiro contemporâneo. Disponível em: <www.horizontecientifico.propp.ufu.br/.../getdoc.php?id...pdf> Acesso em 05 de novembro de 2009.

RAMALHO, Ednéia Cristina. Dificuldades na inclusão do deficiente físico no mercado de trabalho. Disponível em <http://www.revista.inf.br/contabeis08/pages/artigos/cc-edic08-anoIV-art03.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

SAVASSI, Márcia Villaça et al. A inclusão do portador de necessidades especiais (PNE’S) no mercado de trabalho. Disponível em < http://www.faminasbh.edu.br/bh/revistaeletronica/download/Volume2/art08.pdf>. Acesso em 05 de novembro de 2009.

Diana Mazocco Lorenzon é fonoaudióloga e discente do 5° período do Curso de Direito da Faculdade Novo Milênio.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

MÁSCARAS


Fiz o convite a meu amigo Paulo Veras e ele me presenteou com o fantástico artigo que você assistirá abaixo, é a mais pura verdade, diria até que inalienável. Bem, só lendo. Assim o caro leitor terá a oportunidade de tirar à própria conclusão.

Por Paulo Veras

Todos nós as usamos. Sejam de vez em quando, seja diariamente. Todos nós temos uma porção delas. As máscaras, se tornaram acessórios essenciais para nossa sobrevivência. São usadas para disfarçar uma séria de verdades: a idade, nossa verdadeira identificação, nossa identidade, nossa natureza e até nosso espírito. Podemos usa-lás no carnaval, nas festas, nas noites, no trabalho, em casa, nos relacionamentos. Sem dúvidas, as máscaras são poderosos meios de defesa.


Mas as máscaras mais perigosas, são aquelas que usamos no dia-a-dia; aquelas que não tiramos em nenhum momento. São aquelas que não são mais adereços e sim, parte fundamental de nosso caráter, de nossa personalidade. Estão tão impregnadas em nossa vida, que só não disfarçam, como transformam-nos.


Quer seja na história, quer seja na poesia, na arte, lá estão elas. A máscara possui para cada um, um significado próprio, que vai desde o sentido religioso, até o mais pessoal possível. Pode se manifestar-se desde o sagrado, até o profano, do mais cruel até o mais bondoso, do bem até o mal, indo do fraco até o mais forte.


O mais interessante das máscaras, é o poder que elas tem, de esconder o real, o que fato acontece e que por algum motivo, queremos que os outros não vejam. As máscaras são feitas, de acordo as ocasiões e os destinos. Não estão ligadas somente aos grupos, mas também aos desejos e anseios.


E nas relações é que elas de fato se fundamentam. São tão usadas que nunca conhecemos de fato quem está do nosso lado, dormindo conosco e comendo à nossa mesa. De tanto termos máscaras do lado, e que temos a necessidade de criarmos as nossas. A aceitação pela sociedade, através do que somos, só pode se dar através delas. É por isso que encontramos tanta gente que esconde, teima, mente, finge, descarta, aceita, cobra, nega, sorrir, estigmatiza, esquece e por ai vai.


Há os que escondem-se por sua própria vontade; outros vivem ocultos sem saberem disso; e por fim, os que de fantasia se sustentam e sobrevivem. Elas são necessárias. Precisamos delas. Mas como nos bailes que acontecem no ano, elas não podem ser usadas o tempo todo. Precisam ser descartadas de vez em quando e dar lugar à nossa verdadeira identidade.


Paulo Veras é psicólogo clínico e organizacional, psicanalista e professor universitário em Goiânia-GO.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Por um mundo duradouro: em que eu acredito


O que se segue, meus caros leitores, são trechos da Conferência proferida por Eric Hobsbawm a estudantes de uma faculdade do Leste Europeu, em 1994, logo após a desagregação do mundo socialista. Hobsbawm percebe a função social do historiador em um tempo (fim da guerra fria e início do que convencionar-se-ia a chamar de “nova ordem mundial”, bem certo, acredito que aquele era um momento de incertezas) e, mais ainda, percebe o papel do professor de uma universidade em sua plenitude, tudo que eu sempre acreditei e esperava dos meus professores. Bem como espero que eu esteja atingindo na qualidade de educador.


“Ora, a história é a matéria-prima para as ideologias nacionalistas ou étnicas ou fundamentalistas, tal como as papoulas são a matéria prima para o vício da heroína. O passado é um elemento essencial, talvez, o elemento essencial nessas ideologias. Se não há nenhum passado satisfatório, sempre é possível inventá-lo. [...] O passado legitima. O passado fornece um plano de fundo mais glorioso a um presente que não tem muito o que comemorar. Eu me lembro de ter visto em algum lugar um estudo sobre a civilização antiga da cidades do vale do Indo com o título Cinco mil anos de Paquistão. O Paquistão nem mesmo era cogitado antes de 1932-3, quando o nome foi inventado por alguns militantes estudantis. Apenas se tornou uma demanda política séria a partir de 1947. [...] Mas, de certo modo, 5 mil anos de Paquistão soam melhor do que 46 mil anos de Paquistão.”


[...] “Eu costumava pensar que a profissão de historiador, ao contrário, digamos, da de físico nuclear, não pudesse pelo menos, produzir danos. Agora sei que pode. Nossos estudos podem se converter em fábricas de bombas, como os seminários nos quais o Ira aprendeu a transformar fertilizante químico em explosivos. [...] Temos uma responsabilidade pelos fatos históricos em geral e pela crítica do abuso político ideológico da história em particular.


Pouco preciso dizer sobre a primeira dessas responsabilidades. Não teria nada a dizer, não fosse duas circunstâncias. Uma delas é o modo atual de os romancistas basearem seus enredos na realidade constatada em lugar de inventá-los, confundindo com isso a fronteira entre fato histórico e ficção. [...] Não podemos inventar nossos fatos. Ou Elvis Presley está morto ou não. [...]”


“[...] Temos de resistir a formação de mitos nacionais, étnicos e outros, no momento em que estão sendo formados. Isso não nos fará populares. [...] Mas, isso tem que ser feito, e espero que os historiadores aqui presentes o façam.


Isso é tudo o que eu queria dizer sobre o dever dos historiadores. Porém antes de terminar, quero lembrar mais uma coisa. Como estudantes dessa universidade, vocês são pessoas privilegiadas. As perspectivas são as de que, como bacharéis de um instituto conhecido e privilegiado, irão obter, se assim escolherem, uma ótima condição na sociedade, carreiras melhores e ganhos maiores que os de outras pessoas, embora não tanto quanto os de prósperos homens de negócio. O que eu quero lembrar a vocês é algo que me disseram quando comecei a lecionar em uma universidade. ‘As pessoas em função das quais você está lá’, disse meu próprio professor, ‘ não são estudantes brilhantes como você. São estudantes comuns com opiniões maçantes, que obtêm graus medíocres na faixa inferior das notas baixas, e cujas respostas nos exames são quase iguais. Os que obtêm as melhores notas cuidaram de si mesmo, ainda que seja para eles que você gostará de lecionar. Os outros são os únicos que precisam de você’.


Isso não vale apenas para a universidade, mas para o mundo. Os governos, o sistema econômico, as escolas, tudo na sociedade não se destina não se destina ao benefício das minorias privilegiadas. Nós podemos cuidar de nós mesmos. É para o benefício da grande maioria das pessoas, que não são particularmente inteligentes ou interessantes [...], não são prósperos ou realmente fadadas ao sucesso, não são nada de muito especial. É para as pessoas que, ao longo da história, fora de seu bairro, apenas têm entrado para história como indivíduos no registro de nascimento, casamento e morte. Toda a sociedade na qual valha a pena viver é uma sociedade que se destina a elas, e não aos ricos, inteligentes e excepcionais, embora toda a sociedade em que valha a pena viver deva garantir espaço e propósito para tais minorias. Mas, o mundo não é feito para nosso beneficio pessoal, e tão pouco estamos no mundo para nosso benefício pessoal. Um mundo que afirma ser esse o propósito não é bom e não deve ser duradouro.”


Bibliografia:


HOBSBAWM, Eric. Sobre história. São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 17-21.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

"BH de JK"

Ola meus caros amigos. Acredito que escrever é uma arte e, como tocar um instrumento, ela depende, muito além do conhecimento musical, do amor. Logo fiz uns convites a amigos que sei que quando escrevem fazem com amor. Assim minha amiga, Júnia, também historiadora, autora do Vintage Blog, escreveu para mim um excelente artigo sobre a administração de Juscelino Kubitscheck em Minas Gerais na década de 1940. Obrigado minha cara amiga.


Por Júnia Lemos



Em abril de 1940 tomava posse como prefeito de Belo Horizonte Juscelino Kubitscheck de Oliveira. Sua meta nesta época já era o desenvolvimentismo e sempre no menor espaço de tempo possível. Simultaneamente à política modernizadora de JK, explodia na Europa a II Guerra mundial gerando dificuldades para que o prefeito então em exercício colocasse em pratica suas idéias devido a alta nos produtos. Mas isso não freou Juscelino que iniciou um processo de infra-estrutura necessário para o progresso que inevitavelmente despontava.


Construiu o que viria a ser um marco na economia e na indústria e colocaria BH em pé de igualdade com as grandes cidades brasileiras: a cidade industrial e o bairro Eldorado ao lado do pólo industrial, sendo este último uma espécie de “cidade dormitório” para os operários.


Na época não havia acesso até a região, então o prefeito belorizontino mandou prolongar a famosa avenida Amazonas até a Gameleira. A avenida tinha 35 metros de largura, canteiro central e passeios largos e seguia quase que em linha reta, com apenas três curvas, permitindo ligação rápida com o novo pólo industrial.





JK também se voltou para a questão do lazer dos mineiros e então a represa criada para o abastecimento de água da capital, tornou-se um lago artificial de raríssima beleza ( e recebeu o nome de Pampulha em homenagem ao córrego que ali passava e que havia sido represado).


Um arquiteto recém formado veio ajudar JK na reformulação de BH, o jovem Oscar Niemeyer. Ele fez o projeto urbanístico para a lagoa que não poderia ser apenas monumental, mas de valor urbanístico, turístico e social.




O projeto contava com quatro obras:

O Cassino: um monumento feito com concreto armado, projetando-se para dentro da lagoa em estilo moderno e de grande bom gosto. Todo cercado de jardins e desembocadores que permitiam o acesso também pelo lago, procurando desta forma prepará-lo já para o turismo e visando dar a BH uma obra que refletisse seu progresso.






A Pampulha não poderia deixar de ter um espaço para prática religiosa e para isso foi criada a polêmica Igreja São Francisco de Assis - A igreja durante quase duas décadas não foi reconhecida pelos representantes católicos devido à sua forma um tanto quanto moderna para a época da construção.






Com finalidade de se criar na região um centro de reuniões, foi projetada a Casa do Baile, local destinado a diversão da elite mineira.






No próprio lago foi criado o Iate Golf Clube, de dimensões imensas e também voltado para alta sociedade mineira.






Para que a região não perdesse sua beleza mesmo a noite, foram instaladas 174 lâmpadas de 150 wts em postes de concreto.


Tudo isso teria sua importância diminuída se não houvesse boas vias de acesso até local. JK mandou de imediato melhorar a estrada velha da Pampulha. Mas a pequena via não estava à altura da grandiosidade da obra. Mandou então construir a Avenida Pampulha (hoje Antônio Carlos). Para sua construção foram exigidos trabalhos arrojados, feitos cortes profundos e canalizados dois córregos, o da Cachoeirinha e o da Lagoinha. Foi feito o serviço de embelezamento com jardins e iluminação. O projeto foi concluído 50 dias antes do prazo previsto.


Belo Horizonte cresceu muito com as mudanças urbanísticas do prefeito Juscelino, mas por outro lado, a popularidade do mesmo graças a estas e outras grandes obras em Minas tornaram-se destaque de seu governo, abrindo portas para sua escalada a presidência da república.


Como líder Máximo do país no final da década de 50 e início de 60 carregou consigo fortes característica do populismo e desenvolvimentismo. JK também foi acusado diversas vezes de corrupção. As acusações vinham desde os tempos em que ele era governador, e se intensificaram no período em que ele foi presidente.


Ainda hoje é um dos políticos mais admirados do cenário nacional, sendo considerado um dos melhores presidentes que o Brasil já teve.


BIOGRAFIA:

SILVA, Luiz Roberto da. Doce Dossiê de BH. Belo Horizonte, gráfica Editora Cedáblio Ltda., 236 p.


Autora:

Júnia Lemos, além de minha amiga blogueira, é formada em história pela UNI-BH em 1995, Pos-graduada e Brasil Colônia pela PUC/MG e Pós-graduada em História da Arte pela UNI-BH.

domingo, 22 de novembro de 2009

Empobrecimento Urbano: o caso da Grande Vitória


Com a obra, Industrialização e Empobrecimento Urbano: o caso da Grande Vitória, 1950-1980, a autora Maria da Penha Smarzaro Siqueira, conseguiu mostrar ao ávido apaixonado por história do Espírito Santo, á luz da história econômica, as transformações ocorridas na estrutura econômica capixaba, mais precisamente na década de 1960, e as implicações sociais desse processo.


INTRODUÇÃO


O trabalho de Maria da Penha vai detectar, de forma mais profunda, as questões fundamentais do processo de modernização econômica por que passou o Espírito Santo, no período de 20 anos (1960 – 1980), diretamente relacionadas às transformações ocorridas na Grande Vitória.


A autora propõe que a partir de 1960 houve um processo de mudança estrutural/conjuntural por que passou o Espírito Santo. Mudanças que foram acompanhadas por um amplo processo de industrialização e pela expansão urbana, que marcaria a década de 1970.


MUDANÇAS ESTRUTURAIS DA ECONOMIA DO ESPÍRITO SANTO


Conjuntura político-econômica nacional: o modelo de crescimento urbano


A autora nos mostra que até 1930, o crescimento da economia nacional dependia basicamente da produção agrícola. O Brasil exportava produtos primários e importava grande variedade de bens de consumo. A Primeira Guerra mundial, a crise econômica de 1929 e a Revolução de 1930 criaram então as condições para o início do processo de ruptura com o passado colonial. Assim nos anos de 1930 e 1950 há um desenvolvimento de um setor industrial. Surge um novo modelo de crescimento, significando um passo na maturidade do capitalismo brasileiro, com a chegada das empresas multinacionais.


A autora nos mostra que a partir de 1964 adentramos no contexto do capitalismo monopolista. Os militares têm a sua intervenção, na defesa da “ideologia nacionalista”, centrada na lógica da acumulação nacional, viabilizada pelo capital monopolista.


A partir de 1968, então, a economia brasileira dá início a uma acelerada expansão, caracterizando o “milagre brasileiro”. E que a partir de 1973 esse ritmo do crescimento começa a declinar.


Espíritos Santos e a realidade conjuntural


Maria da Penha nos mostra que embora o Espírito Santo estivesse situado na área geoeconômica do país (região sudeste) não acompanhou o mesmo dinamismo econômico regional, mantendo um caráter de subdesenvolvido. A isso a autora aponto como uma das causas a falta de expressividade política dentre as demais unidades do país.


O Estado ficou excluído, e a base agrária que caracterizava a economia capixaba não permitia ampliar os limites da dependência da economia cafeeira, geradora predominante da renda estadual. A estagnação econômica, portanto, mostrava-se nítida em dois pontos: na dependência do café e na falta de capital interno.


Na segunda metade da década de 1950 mudanças econômicas ocorreriam. Em função da queda do preço do café em âmbito nacional e internacional, dar-se-ia início a um a um novo ciclo de expansão de investimentos industriais, em nível nacional, que iriam causar impactos positivos no setor industrial capixaba. O Plano de Metas acabou incentivando a instalação da industria siderúrgica e da industria de cimento no Estado.


A crise do café, vai nos dizer Maria da Penha, será um fator decisivo nesse processo de mudança, a partir de 1968, serão nítidas as conseqüências do processo de erradicação dos cafezais. É a partir da segunda metade da década de 1960, que se inicia uma nova fase da vida econômica do Espírito Santo. Os governos marcariam sua gestão priorizando o trabalho por uma melhor integração Espírito Santo/Brasil.


Década de 1970, e o Espírito Santo é, finalmente, incluído como área de atenção alocando-se recursos na produção de bens intermediários destinados ao mercado externo. A autora faz referência ao setor de metalurgia e celulose. Os lucros gerados por essas empresas, todavia, não seriam investidos no Estado.


Simultaneamente a esse processo ocorrera a desruralização e urbanização, houve uma incapacidade aguda dos setores urbanos absorverem todo o contingente de pessoas, acarretando em empobrecimento social. A região da capital transformou-se em centro de concentração das camadas mais desfavorecidas.


Declínio do setor cafeeiro e reorientação da economia estadual


No fim da décadas de 1940 e durante a década de 1950 a importância da cafeicultura na economia estadual foi acentuada devido a alta dos preços internacionais. Durante o período da segunda Guerra a produção de café brasileira havia decrescido em função da redução da exportação. A partir de 1957 iniciou-se um ciclo de superprodução no mercado internacional.


A fim de controlar essa super produção foram criados mecanismos de redução da supersafras: em 1961 foi criado o Gerca – Grupo Executivo da Recuperação Econômica da Cafeicultura – que elaborou o plano da erradicação dos cafezais com direito a indenizações.


A indenização foi um meio encontrado pelos proprietários dos velhos cafezais para quitar suas dívidas e terem perspectivas de novos investimentos. Os efeitos do plano foram mais sensíveis nos pequenos e médios agricultores e o objetivo principal, que era forçar a diversificação agrícola, foi pouco significativo. A pecuária bovina, nos diz a autora, ganhou extraordinário dinamismo e acelerou-se a migração para as cidades.


O programa de erradicação dos cafezais desestruturou a economia capixaba, por outro lado, ajudou a promover recursos permitindo incremento de projetos agroindustriais – indústrias de madeira e de produtos alimentícios (cana de açúcar e carne). Até 1975, a expansão industrial no Espírito Santo foi comandada por pequenos capitais locais favorecidos pelos incentivos fiscais.


Através das ações conjugadas entre Governo Estadual e Governo Federal o Espírito Santo, a partir de 1975, Modernizou-se. Essa fase dependeu do financiamento do grande capital privado (nacional e estrangeiro).


A QUESTÃO REGIONAL E A POSIÇÃO MARGINAL DO ESPÍRITO SANTO NO ESPAÇO ECONÔMICO BRASILEIRO


Desigualdade regional do desenvolvimento – um enfoque histórico


A partida da década de 1960, grandes transformações ocorreram ao passo que a atividade econômica se deslocou do setor cafeeiro para o setor industrial.


Estruturalmente no país existiam três regiões importantes, como núcleos econômicos: o nordeste, do açúcar, do gado e do algodão; o sul, da pecuária e agricultura alimentar; e o sudeste, do café e da pecuária. De fato o sudeste, das três regiões, foi a mais dinâmica em razão de sua íntima ligação com o capital internacional que fez através do comércio do café.


Todavia dentro do sudeste encontra-se o Espírito Santo que não acompanhou o nível de desenvolvimento regional. Maria da Penha aponta para esse problema como sendo resultado da falta de acumulação de capital, ao isolamento e devido a sua falta de infra-estrutura manteve grande dependência do Rio de Janeiro, sem contar que o Espírito Santo permaneceu marginalizado pela política centralista imperial. O que ocorrera com o Espírito Santo é que houve um predomínio de uma economia cafeeira familiar e o capital acumulado pelo Estado não fora suficiente para fomentar investimentos de vulto. Concluindo: embora o estado estivesse inserido no contexto da dinâmica econômica cafeeira, situou-se entre as regiões consideradas mais atrasadas.


Esse processo sé começou a ser alterado a partir da década de 1960, quando, por iniciativa do Governo Federal, aplica-se a política de erradicação dos cafezais. Dando ao estado novas perspectivas de desenvolvimento econômico.


Espírito Santo e a integração nacional


Existiam três barreiras que deveriam ser vencidas para dinamizar o processo de integração: a da concorrência, a representada pelos impostos interestaduais e a referente ao sistema de transporte.


Até o início dos anos de 1950, o Espírito Santo permaneceu em condições de quase total isolamento das demais regiões do país. Sendo o Porto de Vitória e a Estrada de Ferro Leopoldina seus principais veículos de integração. Assim a partir de 1960 ocorrerá uma expansão dos transportes do Espírito Santo com a construção da estrada litorânea BR 101, com a construção da BR 262 e da BR 259. foram, deste modo, criadas as condições necessárias para o novo ciclo de expansão da economia capixaba em âmbito nacional e internacional.


Assim, no final da década de 1960, começaram a ser viabilizados no Espírito Santo grandes projetos industriais dos setores siderúrgicos e paraquímico que receberam especial destaque nas prioridades do II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) 1975 - 1979. O eixo central do corredor seria a linha da E.F.V.M. (Estrada de Ferro Vitória a Minas).


As mudanças estruturais caracterizadas pelo acelerado crescimento do setor industrial acarretou em uma série de distorções comuns no estado, tais como: fluxo intenso de migração campo/cidade; alto nível de desemprego nos centros urbanos; baixo nível de renda para uma grande parcela da população, por consequência, baixo padrão de vida para extrato menos favorecido.


A INDUSTRIALIZAÇÃO ACELERADA


Os Grandes Projetos Industriais: dinamismo de uma indústria urbana


Maria da Penha nos diz que o processo de modernização econômica configurou-se de forma brusca ocorrendo grande mudanças na estrutura da produção econômica: decadência das atividades tradicionais, crescimento acelerado da pecuária bovina, intensificação do processo e industrialização e o desenvolvimento de atividades ligadas ao turismo.


Na década de 1970 tem início a uma outra etapa do processo econômico, quando se concretiza as decisões de se implantarem no Estado os “Grandes Projetos Industriais”. Novo perfil que viabilizara investimentos em outros segmentos, identificados principalmente pelo setor de prestação de serviços.


O vulto desses investimentos elevou de modo considerável a economia do Espírito Santo e a aglomeração urbana sem levar em consideração seus efeitos. Evidenciando assim um acentuado desequilíbrio espacial na economia do estado.


O advento dos Grandes Projetos Industriais acelerou o fluxo migratório e a região da Grande Vitória não possuía infra-estrutura para receber o grande fluxo. Provocando efeitos negativos, como a marginalização dos trabalhadores menos qualificados, acentuando as desigualdades regionais e sociais. O desenvolvimento econômico transmutou-se em um estado de miséria e desemprego urbano, evidenciando um estado de “caos urbano” na região da Grande Vitória a partir da década de 1970. Havia um sério déficit com setores primordiais como: saúde, educação, habitação, segurança, transporte coletivo, lazer e etc.


Os municípios da Grande Vitória


A grande vitória era constituída por cinco municípios. De fato, nos mostra Maria da Penha, devido ao efeito de expansão da aglomeração, regiões foram gradativamente incorporadas.


Vitória


Vitória é uma ilha montanhosa o que acarretou em um congestionamento nas áreas de encosta de morros. Foi na década de 1960 que o processo de ocupação da ilha se intensificou, iniciando a descaracterização do espaço geofísico da cidade com a ocupação de áreas de mangues, morros e de periferias. A nova configuração espacial teve reflexos negativos na qualidade de vida da população como um todo.


Vitória recebeu migrantes do sul da Bahia, norte de Minas, Zona da Mata Mineira, norte do Rio de Janeiro e interior do próprio Estado, esses migrante buscavam trabalho e melhores condições de vida.


Cariacica


Teve sua ocupação urbana integrada ao processo de consolidação do pólo de Vitória, a partir da década de 1960.


Viana


O município de Viana repete, em linhas gerais, o perfil de ocupação de Cariacica.


Serra


Como Viana e Cariacica, o município da Serra possui características semelhantes em termos de ocupação e estrutura socioeconômica. A região abrigou também algumas atividades de apoio ao porto exportador de minério da Companhia Vale do Rio Doce.


Vila Velha


Apresentou um crescimento lento que se intensificou a partir do início da década de 1960, estimulado, nos diz a autora, pela conclusão e pavimentação da rodovia Carlos Lindenberg. O município não se destacou como centro industrial, até o final da década de 1970 possuía poucas indústrias, a maioria de produtos alimentícios. A ocupação de morros e mangues no centro e na periferia do município gerou favelas e contribuiu para evidenciar a falta de infra-estrutura urbana de Vila Velha.


O crescimento econômico e a hegemonia do grande capital


Apesar do crescimento apresentado pelo setor industrial, até 1975 ainda predominavam no Estado os pequenos e médios estabelecimentos industriais.


O crescimento desse setor, nos diz Maria da Penha, se apresentou com duplo aspecto: criou condições de trabalho para uma parcela da população com baixa qualificação e deu oportunidades a pequenas atividades autônomas de trabalho relacionadas a prestação de serviços – constitui o chamado setor informal. A crescente urbanização estimulou, consequentemente, a indústria da construção civil.


A partir de 1975 daria início a segunda fase de desenvolvimento capixaba, caracterizado por uma nova dinâmica do processo de acumulação. Há uma intensificação do processo de diversificação econômica e modernização capitalista com a implantação de várias atividades não tradicionais, que, sobre a forma de grandes projetos de impactos, modificaram radicalmente a estrutura industrial do Estado.


Essa mudança foi comandada pelo “grande capital”, composto, em sua maioria, de grandes grupos estatais privados, tanto nacionais como estrangeiros.


DESENVOLVIMENTO ESTADUAL E EXPLOSÃO DEMOGRAFICA URBANA


A dinâmica da população


Ao analisar a dinâmica da população do Espírito Santo Maria da Penha revela dois grandes desequilíbrios na sua história demográfica: um deles situa-se no contraste entre povoamento da região sue e região norte, que apresentavam grandes disparidades em termos de concentração populacional.


A explicação, nos diz a autora, está na própria história. A partir da metade do século XIX a lavoura cafeeira que ganhou fôlego com a vinda de imigrantes europeus a população rural ganhou força.


O outro ponto reside na proporção do número de habitantes da região da Grande Vitória que já em 1940 se destacava como a região de maior concentração urbana estadual. Os anos de 1960 marcam justamente o período que inicia o grande esvaziamento das zonas rurais, e continuo aumento da população urbana.


BIBLIOGRAFIA:


SIQUEIRA, Maria da Penha Smarzaro. Industrialização e empobrecimento urbano: o caso da Grande Vitória, 1950-1980. Vitória: EDUFES, 2001. 179 p.