segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Sempre mais do mesmo

Por Douglas Barraqui

Hoje nosso país passa por uma prospera fase de vacas gordas, mas ao mesmo tempo vertiginosamente perigosa. E o que os intelectuais têm a dizer sobre esse momento da história do tempo presente do Brasil? Nada. Absolutamente nada. É sempre o mais do mesmo.

Ninguém quer arriscar à errar: jornais, revista, livros, é sempre o mais do mesmo. Textos de ontem em uma roupagem de hoje, restaurados. Ninguém se aventura em analisar as mudanças no Brasil de ontem no hoje. Diante de um verdadeiro “ritual de passagem” em que o país se destaca como uma grande potencia econômica, pseudo intelectuais cospem merdas em forma de palavras. Os ditos intelectuais pisam em ovos, tentando tirar os seus da reta.

Não se pensa mais em idéias impensáveis. Veja um exemplo: a despeito da globalização uns ainda tendem a ver como fundamental e inevitável, outros insistem como conspiratória e perigosa. O que é isso? Puro maniqueísmo em verdadeiro preto e branco. Onde estão as outras cores? Será que o movimento GLBT foi o único capaz de, em tempos do Brasil em transformações sociais latentes, mesclar outras cores. Não sendo mero acaso sua bandeira de luta ser multicolorida e está ganhando espaço.

Quando eu falo mais do mesmo eu invoco discussões do tipo: sociedade de consumo, exclusão social, perda da identidade, capitalismo selvagem. É nítido como reluz o ouro que as discussões dos temas óbvios, desta conjuntura histórica na qual o Brasil está passando, são mesmo pobres. E as pessoas persistem em agarrar-se nessas idéias como sendo valiosas relíquias. Alguém já te disse que quem gosta de coisa antiga é historiador.

Pois bem. O fato é que a originalidade antropofágica foi enterrada com Oswald de Andrade. Não se “come” e “digere” como estava descrito nas receitas do movimento antropofágico brasileiro. As idéias na boca de uns e de outros são mastigadas, jogadas de um lado para o outro e cuspidas nas páginas de jornais, revistas e livros. É óbvio que não se trata de um novo Brasil, mas sim de coisas novas acontecendo em um Brasil ainda antigo. Será mesmo difícil ver isso? É o que a gente lê? É sempre mais do mesmo, mesmices e hipocrisia. Pronto, falei.  

domingo, 30 de outubro de 2011

Níkos Poulantzas e Otto Bauer: uma visão da esquerda sobre o fascismo

Hitler e Mussolini
Por Douglas Barraqui

Para Níkos Poulantzas, filosofo e sociólogo grego, o fascismo constitui de uma forma de estado e uma forma de regime, representando uma conjuntura extremamente particular da luta de classes. Desenvolveu-se de forma orgânica a partir da democracia burguesa. Na concepção da Internacional comunista, compartilhada por Trotsky, fascismo corresponde a uma guerra civil aberta da burguesia contra a classe operária.

Poulantzas destaca que o fascismo não é a simples substituição de um governo burguês por um outro, mas sim uma mudança na forma de Estado. Trata-se de um fenômeno complexo que pode ser explicado a partir das suas relações com as diversas classes de lutas. O processo de fascização e a instauração do fascismo correspondem à situação de aprofundamento das contradições internas entre as classes e a fração da classe dominante.

A conjuntura do fascismo corresponde a uma crise da ideologia dominante, a democracia liberal. E acima desta crise ideológica podemos falar em uma conjuntura determinada - o pós-guerra, as consequências para os países derrotados e a crise de 1929.

Poulantzas divide o processo de fascização da seguinte maneira: em primeiro momento há o aparecimento das milícias; e em um segundo momento ocorre o recrudescimento do papel do próprio Estado.

Ainda sobre a forma embrionária de bandos armados, milícias, assumem um caráter de partido de massa quando apoiado por frações dominantes durante a etapa de ofensiva contra o proletariado. Nesse momento o partido fascista, dando garantias seguras, ganha o apoio do grande capital e sua ligação com as massas populares mantém-se forte.

Em outro momento o fascismo caminha em direção as massas há ainda uma aliança entre a fração monopolista e a pequena burguesia. Uma vez no poder: Concessões são dadas as massas, é o momento em que  se dá início da dominação do Estado.

No período de estabilização do fascismo: é imposto pelo bloco no poder certas concessões às massas populares. É neste momento que se estabelece a hegemonia do grande capital.

Na visão de Otto Bauer, um dos principais pensadores esquerda, o fascismo é resultado de três processos sociais: Primeiro: A guerra expulsou da vida burguesa e desempregou grande massas incapazes de retornar ao modo de vida burguês, formaram milícias fascistas, com peculiar ideologia militarista, antidemocrática e nacionalista. Segundo: A crise econômica do pós-guerra levou a miséria grandes massas de pequenos burgueses e camponeses. Essas massas abandonaram as fileiras dos partidos de massas democráticos e levantaram-se cheios de ódio e decepção contra a democracia. E por último: Diminuição dos benefícios contra das classes capitalistas que para ressarcir-se aumentou o grau de exploração sobre a classe operária. Como a classe capitalista duvidava que pudesse conseguir por intermédio do regime democrático conter a classe operária, optou então em recorrer às milícias fascistas nacionalistas para que semeasse o terror na classe operária.

Capitalistas ajudaram os fascistas em primeiro momento com auxílio financeiro, posteriormente induzio o Estado a fornecer armas aos fascistas e por fim cedeu o poder Estatal aos fascistas.

O exemplo do caso da Itália os oficiais da reserva desmobilizados depois da guerra foram quem constituiu os núcleos do partido fascista. Homens que não estavam na vida burguesa; odiavam o capitalista especulador;  orgulhosos de suas condecorações e seus ferimentos e que criaram uma aversão ao capitalismo proletário; ressentidos, pois sua pátria, pelo qual haviam dado seu sangue, não podia oferecer-lhes melhores condições e posições; nacionalistas exacerbados em oposição a democracia; homens que não queriam deixar os antigos hábitos contraídos durante a guerra: desejavam dar e receber ordens, usar uniformes e desfilar no ritmo da marcha. Apreciavam assim a indústria da guerra.

Foram esses homens que começaram a formar as organizações paramilitares (ainda mais numerosos na Alemanha). Foram essas as células primordiais do fascismo as que desenvolveram sua ideologia geral.

Para o caso da Alemanha a República na Alemanha nasceu em meio a uma amarga miséria. Um país arruinado no pós-guerra e humilhado. Foi nessa conjuntura que os nacionalista da intelectualidade rebelaram-se contra a situação do país. Assim podemos dizer que as consequências do pós-guerra mundial contribuíram assim para fomentar o nacionalismo alemão.

A grande crise do sistema capitalista de 1929 teve um impacto muito forte sobre a Alemanha e Hitler soube muito bem manobrar a crise de modo colocar o povo a seu lado e o nazismo no poder. Antes da crise, durante a época de prosperidade, o partido Nacional Socialista de Hitler era um grupo sem importância, com a crise de 1929 ele ganha força. A democracia não pode evitar que a crise arruinasse a pequena burguesia e camponeses. Assim esses voltaram-se contra a democracia. Em meio as constantes pressões por parte da classe operária a classe capitalista então decidiu fazer do fascismo para submeter a classe operária. Foi através das “expedições de castigo” que a classe capitalista descobriu como romper com o impetuoso ataque da classe operária. A milícia fascista foi lugar de confluência dos marginalizados de todas as classes. Podemos concluir em Otto que o fascismo nacionalista seria patrocinado pela burguesia e seu poder Estatal.

Uma vez no poder o partido fascista dominaria o proletariado; expulsaria os representantes da burguesia do poder dissolvendo seus partidos sob a justificativa de que salvaria a burguesia da revolução proletária. Na verdade o movimento operário já estava debilitado. Era o momento dos capitalistas escolherem entre destruir o fascismo e assim favorecer a classe operária, ou ceder ao fascismo o poder estatal. Talvez tarde de mais; pois o terror fascista dissolveria e submeteria à sua tutela algumas organizações capitalistas.

Níkos Poulamtzas e Otto Bauer são contribuições valiosas no que tange a compreensão dos regimes fascistas da Europa entre guerras, bem como o processo de fascilização. São autores que embora partem de uma visão de esquerda devem ser lidos e levados em consideração no estudo da história política da Europa.
Bibliografias:

BAUER, Otto. O Fascismo.

POULANTZAS, Nicos. Fascismo e a ditadura: A III Internacional face ao fascismo. Tradução João G. P. e M. Fernanda S. Granado. 1ª ed. Porto: Portucalense Editora, 1972.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

A Política em Wolfgang Leo Maar

Por Douglas Barraqui

Em “O que é Política” Wolfgang Leo Maar esboça algumas temáticas do universo político de uma forma bem didática e com uma linguagem clara que facilita  a compreensão.

O autor nos ensina que as relações políticas não se dão apenas com a política institucionalizada, ou seja, estatal. Que nós seres humanos somos políticos, praticamos política no nosso dia-a-dia, uma vez que, quer seja no âmbito institucional, quer seja nas relações sociais do cotidiano estamos promovendo relações de poder, que para nosso autor é uma atividade política fundamental. Portanto, para Wolfgang Leo Maar, dentro de uma sociedade que objetiva o poder, existem diversas formas de política.

Wolfgang Leo Maar nos apresenta os partidos políticos como agentes políticos da sociedade moderna. A disputa partidária apresenta-se, para o autor, em dois vieses: de um lado como uma relação com a sociedade e seus interesses; de outro lado como disputa pelo controle do aparelho do Estado. O autor busca em Gramsci a função dos intelectuais orgânicos na atividade política, segundo o qual o intelectual tem como papel elaborar propostas de cunho cultural e política para transformação dos sujeitos e posterior transformação do mundo. Maar vê a política como resultado de um processo histórico. Assim ela se apresenta como atividade aberta ao movimento e a transformação constante.

Ao abordar a política na Grécia e na Roma Antiga, Maar nos diz que a política foi talhada a partir da atividade social dos homens que viviam nas pólis gregas. Filósofos como Platão e Aristóteles teriam dado incomensurável contribuição  e lição, para o mundo ocidental, sobre política.

Maquiavel, nos diz Maar, fez importante distinção entre política de Estado e de Governo. Em Maquiavel o agente da atividade política do Estado é o governo, assim sendo, o dirigente deste governo (em Maquiavel  seria o príncipe) deve possuir virtude, capacidade diante dos acontecimentos de caráter políticos, a finalidade é o poder. Nosso autor elenca ainda que para se governar é necessário ter força, astúcia e, porque não, sorte. Buscando novamente em Gramsci, o autor destaca que o príncipe moderno é nada mais nada menos do que o partido político, e sua meta fundamental é o poder estatal.

Em Marx, o autor diz que a política trata-se de uma disputa de classes sociais, onde o Estado representa a classe dominante, logo o Estado passa a condição de representante de uma classe. Assim a atividade política deixa de ser espaço exclusivo do Estado, para passar a ser palco da luta de classes. A “política”, em Marx, é resultado da luta de classes, deste modo a classe dominada, ou seja, o proletariado tem que desenvolver uma política que supere a sociedade de classes, supere o capitalismo, na busca pelo socialismo.

Maar questiona ainda o papel da política na sociedade brasileira atual, na vida das pessoas (leve em consideração que este livro foi escrito em 1982). Nosso autor se utiliza de alguns momentos da história do Brasil para demonstrar como a política é submetida a constante imprevisibilidade, mudanças e transformações. Com isso, quer nos mostrar que atividade política deve ser compreendida como uma ação prática e transformadora da realidade histórica, havendo deste modo uma gama de orientações possíveis para a política. Apresenta-nos ainda que a atividade política institucional em torno do Estado foi desenvolvida pelos homens ao longo da história, como uma forma prática de organizar a vida social, coletiva buscando atender o interesse comum. Destaca ainda que o Estado pode ser agente da persuasão, do consenso, quer dizer, pode agir através da coerção ou da hegemonia.

Maar nos ajuda a compreender melhor a diferença entre sociedade política e sociedade civil. A sociedade política trata-se da administração pública, o judiciário, as forças armadas; a sociedade civil por sua vez é onde estão os partidos, empresas, sindicatos, movimentos sociais, escolas. Logo, a sociedade civil teria suas próprias instituições para fazer suas reivindicações ao Estado e os partidos políticos seriam as principais instituições, bem como os sindicatos e outros movimentos sociais. Com isso as atividades políticas exercidas pelo Estado buscam o consenso da sociedade civil.

O autor também promove uma discussão entre a relação existente entre política, cultura e ideologia. Como a cultura se manifesta na política, partindo do princípio de que as manifestações culturais oferecem meios para a realização de preceitos políticos, portanto, a cultura não deve ser rebaixada, pois ela tem uma função política, podendo ser utilizada com uma finalidade política. A classe dominante, por exemplo, tenta impor sua cultura como se seus valores fossem universais. A cultura, portanto, aparece com um apoio ideológico usado na legitimação do poder da classe dominante. Maar busca em Georg Lukács a elaboração de que a cultura aparece como uma estratégia política para tomar o poder. E que a cultura pode aparecer como uma função ideológica tanto para quem está no poder, “ideologia conservadora”,  como para os que desejam mudar o poder por intermédio de uma revolução, “ideologia libertadora”. Gramsci chama essa disputa pela conquista do estado de “guerra de posições” e aqui entra os intelectuais com seu papel de produtores da cultura. Portanto, a política também é cultura, ao passo que ela molda sentimentos e comportamentos que influenciam na transformação da realidade.

Maar diz que a política produz uma série de referências e valores para a humanidade, logo a política possuiria também uma missão civilizadora. E o autor nos ínsita a pensar em questões como coloca: Qual o papel do Estado perante a sociedade? Será mesmo que vivemos em um país democrático? Quais os limites das ações do Estado? E o que estamos fazendo enquanto cidadãos, como seres políticos, para alterar a atual realidade política de nosso país.

Referência:

MAAR, Wolfgang Leo. O que e política. 16ª ed. - São Paulo: Brasiliense, [1989?]. 109p.

sábado, 20 de agosto de 2011

Mas, você vai ser professor?


Por Douglas Barraqui

“Mas, você vai ser professor?” é essa a frase de uma comunidade de uma dessas páginas de relacionamentos da internet. Um estudante que almeja entrar em sala de aula e ser professor nos dias de hoje tem pela frente um desafio ciclópico. Digo isso por propriedade com uma boa experiência em sala de aula trabalhando com os pequeninos e curiosos do fundamental; com os adolescentes, as vezes rebeldes sem causa, do ensino médio; passando pelos inseguros jovens pré-vestibulandos, até os esforçados dos preparatórios para concursos. Em fim, tendo eu assistido por esses anos de labuta o atual quadro da educação brasileira e o que de fato significa estar dentro de uma sala de aula com vinte a quarenta alunos esperando algo de você, retruco ao futuro jovem professor: você quer ser professor?

Este não se trata de um daqueles manifestos de insatisfação com a atual condição da educação brasileira, tão pouco farei deste um lamento sobre as dificuldades que um professor tem em sala de aula. Quero apenas ser fidelidigno com a atual realidade conjuntural de uma sala de aula com base em minha experiência. E mais ainda fazer com que você perceba que sala de aula, lecionar, lidar com crianças, jovens em formação é algo que tem que ser feito de forma apaixonada, com amor.

Pareço um tanto subjetivo, mas, veja o que você, futuro professor, terá pela frente: uma sala de aula. Analisando a escola como um espaço sócio-cultural podemos lançar nossos olhos sobre um quadro dinâmico, que se faz presente no cotidiano dos dias letivos, levado a efeito por homens e mulheres, trabalhadores e trabalhadoras, negros e brancos, adultos, adolescentes, jovens, crianças, em fim, alunos e professores, seres humanos concretos, sujeitos sociais e históricos, atores históricos, filhos de seu tempo.

A instituição escola nos aparece como resultado de um confronto de interesses: de um lado, uma organização oficial do sistema escolar, que define o conjunto de regras e normas, atribui funções e tarefas definindo as chamadas relações sociais. Do outro, os sujeitos, alunos, professores, funcionários, que criam uma trama própria de inter-relações, fazendo da escola um processo permanente de construção social. O que eu quero dizer é que no âmbito da escola e dentro da sala de aula interagem diversos processos sociais que vão desde a reprodução das relações sociais, passando pela criação, transformação e difusão do conhecimento. Isso é uma escola,  dentro dela está a sala de aula e sentados em suas carteiras estão os alunos.  

Portanto a primeira coisa, a saber, futuro professor, é que a escola é um espaço sócio-cultural, ordenado por uma dupla dimensão. Nessa perspectiva, a realidade escolar aparece mediada, no cotidiano dos dias letivos, pela apropriação, elaboração e reelaboração de conhecimentos. Isso vai incluir ao seu currículo de professor: alianças, conflitos, imposições de normas e estratégias individuais ou coletivas, transgressão e acordos entre alunos e professores. E isso não será tarefa fácil.

Mas o que é essa escola? E o que de fato ocorre dentro de suas salas de aula? Trata-se de uma instituição que, pelo discurso muito corrente, deveria buscar atender a todos da mesma forma, com a mesma organização do trabalho escolar, mesma grade curricular. Esse discurso é palpável até certo ponto, mas acaba homogeneizando os sujeitos em questão, alunos e professores. Isso leva consequentemente à homogeneização da instituição escola. Assim, materializado nos programas e livros didáticos, o conhecimento escolar se torna objeto e, ao mesmo tempo, coisa a ser transmitida. Supostamente como será de forma homogenia propagada, será igualmente assimilada, e isso não é verdade.

Dentro de sala, você professor, terá uma gama de alunos com as mais diversas propensões, capacidades para querer ou não assimilar o conhecimento: desde o mais hiperativo, ao mais tímido.  

É muito corrente um professor ministrar uma aula com o mesmo conteúdo, mesmos recursos e ritmos para turmas de quinta série, por exemplo, de uma escola particular do centro, e de uma escola pública da periferia, negligenciando as condições sócio-econômicas desses sujeitos alunos. Nesse quadro, a meu ver, ensinar fica resumido a transmitir conhecimento acumulado, e aprender se torna assimilá-lo. O que é valorizado são as notas obtidas nas provas que reduz a escola a uma única finalidade na visão do aluno: passar de ano. A diversidade acaba tristemente reduzida a bom e mau aluno, esforçada e preguiçosa, obediente e rebelde, disciplinada e indisciplinada. O que eu quero lhe mostrar é que muitas escolas são assim hoje, desconsideram a totalidade das diversidades humanas, do sujeito aluno. E não há um culpado, mas sim vários.

O que você tem que saber de antemão futuro professor é que você estará instruindo seres humanos. No primeiro dia de aula, quando você olhar para eles e ver aquele monte de rostinhos assustados pergunte a si mesmo: quem são esses jovens? De onde vieram? O que eles vêm buscar na escola? Qual significado tem para eles a escola? Talvez você não alcance a resposta de todos, mas, terá um panorama geral da diversidade que é uma sala de aula.

Você tem que saber que essas crianças que estão sentados diante de você professor, esperarão algo de você, bem como você esperará delas. Portanto, você jamais deve resumir a escola, e tão pouco o seu aluno, as quatro paredes, janelas e porta da sala de aula. Essas crianças chegaram para você marcados pela diversidade, reflexos de desenvolvimento cognitivo, afetivo e social anteriores, e que são, evidentemente, desiguais e peculiares em virtude da quantidade e da qualidade de suas experiências e relações sociais, culturais anteriores e até mesmo paralelas a escola.

Não pense professor que você vai salvar o mundo. Ou que existe uma receita mágica para ensinar. Mas se você amar o que faz, fará bem. Então, você será professor?

Bibliografia Consultada:

DAYRELL, Juarez. A escola como espaço sócio-cultural. In: DAYRELL, Juarez (Org.). Múltiplos olhares sobre educação e cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999.

domingo, 14 de agosto de 2011

O Materialismo Histórico Dialético: uma breve consideração


Por Douglas Barraqui

Já tentaram, mas foi um fiasco, explicar os fenômenos sociais com auxílio das leis naturais, ou seja, as leis que regem a natureza. A busca incessante pela verdade empírica é como uma sede implacável para homem e, assim sendo, ele desenvolveu referenciais teóricos e metodológicos como forma de explicar a realidade, matar sua sede pela verdade. Tenho que lhes precaver que esse artigo é diminuto, não se trata de algo aprofundado, apenas pode lhe servir como referência para uma primeira análise quanto ao entendimento do Materialismo Histórico Dialético.

Pois bem, e o que vem a ser o materialismo? Em resumo é um conjunto de doutrinas filosóficas que busca explicações para os problemas diretamente relacionados ao plano da realidade no mundo material ao longo da história. Uma explicação materialista dentro de uma interpretação marxista, por exemplo, coloca um problema social do plano real dentro de um modo de produção.

O materialismo histórico, pois bem, é uma tese do marxismo, que com auxílio do conceito de modo de produção da vida material busca explicações para o conjunto de acontecimentos do plano real envolvendo o social, o político, o econômico e o cultural. Trata-se de um método de compreensão e analise do campo da historiografia. O mesmo que coloca sobre a mesa o conceito de lutas de classes.

Uma analise sobre a ótica do materialismo histórico explica a realidade da seguinte forma: a produção material é o pilar da ordem social, é algo que sempre existiu em todas as sociedades. A repartição do que é produzido, aliado a divisão dos homens em classes é determinada pelo o que, e como, a sociedade produz. Um exemplo prático: o modo de produção escravista da antiguidade: o senhor e seu escravo, o patrício e o plebeu em Roma; o modo de produção feudal: o senhor e o seu servo; e o modo de produção capitalista: o burguês e o proletariado.

A respeito da Dialética trata-se de uma palavra de origem grega que significa “verdade”,  para o nosso caso, “Di” seria igual a duas verdades. Assim podemos esquematizar o método dialético da seguinte forma:


A “tese” trata-se de uma primeira proposição dada; a “antítese” é a oposição, ou seja, contrária à tese. Do choque entre a “tese” e a “antítese” é que temos uma conclusão, a “síntese”. A “síntese” é uma conclusão nova, retirada a partir do embate, a “síntese” porconsequinte torna-se uma nova “tese” que ira se chocar com uma nova “antítese” e como resultado uma nova “síntese”, sendo um processo sem fim.  

 “As relações sociais são inteiramente interligadas às forças produtivas. Adquirindo novas forças produtivas, os homens modificam o seu modo de produção, a maneira de ganhar a vida, modificam todas as relações sociais. O moinho a braço vos dará a sociedade com o suserano; o moinho a vapor, a sociedade com o capitalismo industrial”. [1]

O Materialismo Histórico Dialético, portanto, trata-se de um referencial teórico na busca de explicações para os problemas dos fenômenos do plano da realidade. É utilizável? Sim, mas não consegue aplacar toda a complexidade dos problemas do plano real e tem seus problemas explicativos, como vários outros referenciais teóricos também têm.

Bibliografia:
MARX, Karl. Miséria da filosofia. São Paulo: Grijalbo, 1976. 222p

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Rio, o filme: um verdadeiro olhar sobre o Brasil


Por Douglas Barraqui

Rio é um filme de animação, da 20th Century Fox e Blue Sky Studios, foi gravado com o que há de melhor da tecnologia Hollywoodiana, em 3-D. Escrito por Don Rhymer, a surpresa fica pelo seu diretor, o “brazuca”, Carlos Saldanha. Mas, o que há de especial no Rio, filme, e no Rio, cidade, que foi muito bem assistida pelas lentes cinematográficas?

Constantemente os filmes de Hollywood quando tratam do Brasil, passam uma visão deturpada e caricaturada sobre o país, uma mistura entre futebol, samba, bunda e violência, nada mais além: No contexto da Guerra Fria, centrado na política da “Boa Vizinhança”, de manter as terras tupiniquins longe da ameaça comunista e de baixo das asas da águia americana capitalista, nasceu Carmen Miranda, uma mulher baixinha, alguma coisa por volta de 1,53 que, com enormes saltos e um chapéu ridículo de frutas na cabeça, tentava expressar a mais pura alegria do povo brasileiro. Ela teve seu papel. Walter Elias Disney criou o Zé Carioca, o papagaio malandro e boêmio. Portanto, no geral o Brasil é caricaturado como a terra do Samba, do futebol, das lindas morenas de bundas desnudas com abacaxis e bananas na cabeça. Mas, essa caricatura não é uma via de mão única. Nós também brasileiros exportamos, por meio de propaganda essa visão um tanto quanto estigmatizada do país tropical.

Rio, o filme, é uma obra que expressa o olhar de um brasileiro com o que há de melhor da tecnologia de animação americana. O resultado foi estupendo: uma visão mítica do Rio, como cidade e ao mesmo tempo poético, fidedigno a verdadeira face do Brasil, com seu céu azul cobrindo suas verdes matas e favelas, terra de um povo bonito e alegre, crioulo.

Em meio a uma expectativa de Copa do Mundo e de Olimpíadas, Rio, o filme, é um importante instrumento de propaganda e um fiel cartão postal do Brasil. Um Rio poético, comportado em nossa realidade. Assista o filme!

sexta-feira, 22 de julho de 2011

O Brasil República: em linhas gerais

Proclamação da República, 1893, óleo sobre tela de Benedito Calixto(1853-1927). 
Acervo da Pinacoteca Municipal de São Paulo

Por Douglas Barraqui
O que se segue meus caros leitores é uma breve análise econômica, social, cultural e política no contexto da república oligárquica e federalista brasileira, bem como uma analise crítica do real significado das contradições e respectivas manifestações que acarretaram a crise final da primeira república. É este, portanto, um levantamento para primeiras análises centrado principalmente nas obras de Cláudio H. M. Batalha, Mônica Pimenta Velloso, Mário Cléber Martins Lanna Junior, Maria de Morais Ferreira e Sumara Conde Sá Pinto.
Análise econômica
O golpe de 15 de novembro foi resultado da conspiração de militares do exército e da armada, representantes da cafeicultura paulista, das elites gaúchas e positivistas. Durante, basicamente três séculos a política econômica colonial e, também, imperial brasileira tinha como principal objetivo o abastecimento do mercado externo de gêneros agrícolas de origem tropical. O advento da República, praticamente, não alterou essa realidade, apesar do relativo crescimento industrial e da modernização dos principais centros urbanos do país.
A expansão da economia cafeeira iniciou-se por volta de meados do século XIX. E já em 1840 era o principal produto da nossa pauta de exportação. De 1891 até 1928 houve uma grande dependência financeira bem como econômica em relação à exportação do café. [1] A partir desse ponto é muito comum associar a expansão da economia cafeeira a urbanização e a industrialização do país.  E, mais ainda, fatores como: a abolição da escravatura; a própria proclamação da República; a urbanização e a própria industrialização acabaram sendo creditadas aos fazendeiros paulista, agentes da modernidade. É necessário destacar que não há necessariamente uma associação linear e inequívoca entre abolição, República, economia cafeeira, industrialização e urbanização, ou seja, as relações históricas entre esses fenômenos são complexas e contraditórias. [2]
Podemos sim ver que já nas primeiras décadas da república a indústria implantada na região cafeeira, com exceção a Minas Gerais, compunha-se de grande unidade fabris que concentrava parte significativa do capital e do operário nacional. Houve assim, entre 1889 e 1896, um crescimento na acumulação industrial, tendo o ritmo do crescimento diminuído em 1897 e 1904, para então voltar a crescer a partir de 1905 até 1914. [3] O desenvolvimento da indústria a partir do início do século XX foi beneficiado com a expansão da economia cafeeira: a ampliação da área de plantio era geralmente precedida pelas ferrovias, com a finalidade de promover o escoamento até os portos, principalmente Santos e Rio de Janeiro. Ao mesmo tempo surgiam novos núcleos urbanos e com eles ampliava-se a necessidade de consumo e a demanda por abastecimento. Uma parte significativa dessas necessidades era satisfeita com importações, a outra parte, que foi ficando significativa ao decorrer do tempo, passou a ser abastecido pela indústria nacional em expansão. Houve, portanto, uma tendência crescente para a concentração da indústria nas regiões de maior dinâmica da economia cafeeira.
Podemos concluir então que em uma análise econômica, a indústria brasileira se processou em conjunto com a expansão cafeeira, isto é, no momento em que ocorria o vazamento de capitais. Esse foi um dos motivos que explica a sua concentração nas zonas de expansão, o que também não significa que não houve indústrias em outras regiões, nestas o ritmo foi apenas mais lento. 
Análise social
Durante a primeira república embora o Brasil houvesse dado passos importantes para seu processo de industrialização, urbanização e modernização de sua economia, o regime oligárquico representou uma série de obstáculos para o desenvolvimento e a ampliação da cidadania e da democracia. A fim de analisar a sociedade da primeira República partiremos dos operários e de sua formação como classe de trabalhadores.
A formação da classe operária é constantemente pensada como um fenômeno simples e puramente econômico e associado ao desenvolvimento industrial do país. Contudo, é necessário salientar que a existência de trabalhadores fabris, por si só, não assegura a existência de uma classe. A formação de uma classe operaria no Brasil foi um processo gradual, em que essa formação pode ser percebida na medida em que concepções, ações e instituições coletivas, de classe, puderam ser percebidas.
Outro ponto que devemos destacar é o fato de que uma parte significativa desses operários eram imigrantes, homens que atuaram em sua totalidade quer seja no trabalho manufatureiro, quer seja nas indústrias. Assim durante muito tempo elaborou-se uma correlação direta entre a presença de imigrantes no Sudeste e no Sul do país e a militância do movimento operário, bem como a difusão de certas ideologias. Os estudos, contudo, mostraram que a maioria desses imigrantes vinha do campo, e na maioria dos casos não tinham qualquer experiência com organização sindical ou política. Então Cláudio H. M. Batalha conclui que:
Os segmentos de classe operária que mais facilmente se organizaram, em muitos casos desde o século XIX, foram os trabalhadores qualificados, detentores de oficio. [4]
E foi pela liderança desses trabalhadores qualificados que o movimento operário foi moldado pelo discurso e pelas formas de se organizar desses trabalhadores.
Assim o surgimento da classe operária brasileira, como uma realidade histórica, só pode ser observada a medida em que os interesses coletivos se sobrepuseram aos interesses individuais. Portanto, não podemos associar o surgimento da classe operária como um resultado mecânico da existência da indústria ou, e tão menos ainda, com a abolição da escravatura.
Em uma análise de linhas mais gerais, durante a primeira República, as oligarquias rurais e alguns industriais urbanos eram os setores que detinham os maiores poderes, privilégios e importância. Gradativamente a burguesia urbana passou a se impor e a garantir uma maior participação nas decisões.  Os intelectuais objetivavam uma renovação cultural. Consequentemente aqueles que se opuseram e resistiram ao modelo, conhecido como República Oligárquica, foram classificados como “tradicionais, atrasados e bárbaros”. [5] Movimentos sociais urbanos e rurais a exemplo de Revolta da Vacina, Revolta dos Marinheiros, Canudos e Contestado eram resachados como desvios indesejáveis que divergiam da ordem vigente e deviam ser violentamente combatidos.
Podemos concluir, portanto, que a partir do final do império e durante a primeira República a sociedade brasileira se diversificou. Além das oligarquias rurais e da burguesia urbana gradativamente as classes médias ascendem no cenário de luta política alia-se a esse fato a formação da classe operária.
Analise cultural
Os anseios pela modernidade se tornaram cada vez mais evidentes na virada do século XIX para o século XX. A música, a literatura e as artes plásticas vão expressar muito bem os valores dessa cultura. Internacionalmente o modernismo surge no vapor da industrialização e da urbanização do meados do século XIX. No Brasil costuma-se colocar como marco inicial para o início do modernismo a Semana da Arte Moderna de 1922. Entretanto, esse processo, vai nos dizer Mônica Pimenta Velloso, é bem mais amplo e complexo.
Meio século antes de acontecer em são Paulo, a Semana da Arte Moderna, já existia no Brasil um movimento literário que foi denominado pelo crítico da história José Veríssimo de “modernismo”. [6] Personagens como Tobias Barreto, Silvio Romero, Graça Aranha, Capistrano de Abreu e Euclides da Cunha destacaram-se como intelectuais que compunham a chamada “Geração de 1870”. No Brasil o modernismo terá a Guerra do Paraguai (1865-1870) como um divisor de águas entre o antigo e o moderno.
É necessário deixar claro que, antes mesmo da Semana da Arte Moderna, já existiam tradições filosóficas no pensamento brasileiro que foram retomadas e, também, reelaboradas, ao longo da década de 1920. O que ocorre é que grande parte da nossa historiografia não estabelece um vínculo de continuidade entre o pensamento dos intelectuais da geração de 1870 e os da geração de 1920.
Portanto, o modernismo não chegou ao Brasil da noite para o dia. É fruto de um longo processo feito de avanços e recuos, inovações e contestações, frutificando polêmicas. Em uma sociedade em que a falta de um dispositivo amplo constitucional, que assegurasse à acessibilidade a educação a todos, o modernismo se alocaria como uma cultura acessada pela elite. A Semana da Arte Moderna de 1922 pode ser tomada como um marco simbólico desde que não se deixe de fazer uma reflexão sobre as verdadeiras raízes do modernismo no Brasil.
Analise política
O advento da república é, ao mesmo tempo, ambíguo e contraditório. O pressuposto teórico de uma República é o de um governo destinado a servir à coisa pública e ao interesse coletivo, mas o verdadeiro significado da república brasileira foi de um regime limitado no processo histórico de construção da democracia e de expansão da cidadania no Brasil.
O conceito de República oligárquica brasileira é atribuído ao período que vai de 1894, com o governo paulista de Prudente de Morais, até 1930. Foram um pouco mais de 30 anos de um sistema baseado na dominação de uma minoria e na exclusão de uma maioria do processo de participação política. Para compreender o arcabouço político desse período é necessário ter em mente vocabulários como coronelismo, oligarquias e política dos governadores.
A carta constituinte dos Estados Unidos da América serviria como modelo para a primeira constituição republicana, a de 1891. O Brasil se enquadrou em uma realidade distante que era a tradição liberal, norte americana, de organização federativa e do individualismo político e econômico. Podemos ainda dizer que, mais que o individualismo, é o federalismo a grande inovação da constituinte de 1891.
O federalismo substituiu a centralização do império e conferiu aos estados e municípios uma significativa soma de poderes. Sobre esse princípio é que edificou-se a força política dos coronéis, grandes latifundiário que exercem grande liderança local, a nível municipal e das oligarquias nos níveis estadual e federal.
Na tradição dominação do poder privado, o coronelismo demarca uma mudança em aspecto qualitativo. Embora também uma forma de exercício de poder privado, ele não é uma prática. O coronelismo tem uma identidade específica, constitui um sistema político e é um fenômeno datado. [7] Quanto as Oligarquias Maria Efigênia Lage de Resende analisa da seguinte forma:
A geografia das oligarquias dominantes é muito relevante para se entender a dinâmica do sistema. Há estados em que a disputa pelo poder está mais institucionalizada. Neles, o partido estadual funciona como uma estrutura de agregação dos interesses, fato que torna a violência menor. Estão nesse caso Minas Gerais e São Paulo. Em Minas Gerais, Partido Republicano Mineiro congrega os interesses de grupos familiares dominantes nas diversas regiões do estado marcadas, pelas suas origens históricas, por atividades econômicas diferenciadas. Em São Paulo, o Partido Republicano Paulista congrega os interesses dos cafeicultores, representantes da economia dominante e praticamente, à época, exclusiva do estado. [8]
Podemos concluir a partir dessa análise que se o federalismo possibilita a emergência de oligarquias e dos coronéis em seus respectivos âmbitos de atuação, a preponderância dos interesses individuais acabaram por impedir que os temas da nação, a exemplo da cidadania, conseguisse posição importante na agenda política no período da república oligárquica. Outro exemplo é a questão do voto, embora a Constituinte de 1891 tenha ampliado juridicamente a participação política pelo voto e pelo direito de associação e reunião, a verdadeira face da realidade que se impõe é a negação da idéia de participação política. Nos municípios o controle dos coronéis sobre o voto chama a atenção para a questão das fraudes eleitorais. Foram muitos os subterfúgios de falseamento das eleições no chamado “voto de cabresto”.
Foi Campos Sales, que governou o Brasil de 1898 a 1902, que idealizou o arranjo político denominado de “política dos estados” e que ficará conhecido como “política dos governadores”.  Para Campos Sales dois princípios eram fundamentais para a estabilidade da República: o primeiro, de natureza política, faz referência à necessidade de estabelecer princípios que harmonizem o poder executivo e o legislativo. O segundo refere-se às questões de natureza econômica. Sales concebia que a estabilidade monetária e financeira estava condicionada à estabilização política. Essas seriam então as razões básicas e imediatas para a formulação da política dos governadores.
Seu objetivo é o estabelecimento de relações de compromisso entre executivo federal e os executivos estaduais, de modo a possibilitar a formação de um legislativo coeso no plano federal, visando dar sustentação às políticas a serem implantadas em seu governo. [9]
Podemos concluir que a política dos governadores consolida de imediato o domínio das oligarquias estaduais e as forças dos coronéis nos municípios. Afastando a possibilidade de surgirem partidos nacionais, bem como de uma oposição no plano legal. Coronéis e oligarquias, portanto, marcaram o sistema político na primeira República. Denominada por alguns autores como sistema político oligárquico, ou ainda, como sistema político coronelístico, o mais importante é constatar que o sistema político que prevaleceu na República Oligárquica inviabilizava o conceito pleno de República.  
Para concluir
O que você acabou de ler meu caro leitor é apenas um breve tracejo sobre uma análise em aspectos gerais de um pedaço, período republicano, da história do Brasil. A função dessas poucas palavras e auxiliar em um direcionamento em caráter mais gerais de pesquisas. Espero  ter ajudado.
Referências:
[1] NETO, José Miguel Arias. Primeira República: economia cafeeira, urbanização e industrialização. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. O Brasil republicano. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. nv. (O Brasil republicano). P. 210-212.
[2] NETO, José Miguel Arias. Op. cit. p. 195.
[3] NETO, José Miguel Arias. Op. cit. p. 217.
[4] BATALHA, Cláudio H. M. Formação da classe operária e projetos de identidade coletiva. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. O Brasil republicano. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. nv. (O Brasil republicano). P. 170.
[5] NETO, José Miguel Arias. Op. cit. p. 194.
[6] VELLOSO, Monica Pimenta. O modernismo e a questão nacional. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. O Brasil republicano. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. nv. (O Brasil republicano). P. 354.
[7] RESENDE, Maria Efigênia Lage de. O processo político na primeira Repíblica e o liberalismo oligárquico. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. O Brasil republicano. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. nv. (O Brasil republicano). P. 95-96.

[8] RESENDE, Maria Efigênia Lage de. Op. cit. p. 97.

[9] RESENDE, Maria Efigênia Lage de. Op. cit. p. 114.

Bibliografia:
FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. O Brasil republicano. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. nv. (O Brasil republicano). 

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Palavras de Aldous Huxley



“A mensagem de ‘amirável mundo novo’ é que é possível fazer as pessoas contentes com sua servidão. Acho que isso pode ser feito, foi feito no passado  e pode ser feito ainda mais efetivamente agora. Por que você pode dar pão e circo e quantidades infinitas de distração e propaganda.

Parece que os regimes totalitários do futuro não serão baseados em terror. Eles terão outros meios, como lavagem cerebral e propaganda que serão bem mais eficientes e econômicos do que o uso da força. Há técnicas avaliáveis no presente que parecem duplicar algumas das técnicas que eu inventei. A lição mais importante da história é que ninguém aprende as lições da história.”

Aldous Huxley

domingo, 22 de maio de 2011

O nazismo: a banalidade do mal


Por Douglas Barraqui
Regimes totalitários o Socialismo, soviético, e o Nazismo, na Alemanha, surgiram como grandes promessas de um mundo melhor – o socialismo com a promessa de fim da sociedade burguesa e o Nazismo com a promessa de um homem novo, superior e perfeito, a “raça ariana” – , todavia acabaram como marcos das grandes tragédias do mundo contemporâneo.
Meu objetivo aqui é olhar para o Nazismo e tentar explicar como a máquina que trucidou a vida de milhões de pessoas trabalhava. É possível acreditar em uma ideologia que tritura as vidas dos próprios semelhantes? É possível retirar da catástrofe algo de bom? Não seria melhor, como que com uma borracha, apagar e esquecer um passado tão dantesco?
OS JUDEUS
No século XIX os judeus gozavam de uma liberdade especial. Emancipação que significava igualdade e ao mesmo tempo privilégios. Era de interesse do Estado moderno conceder aos judeus certos privilégios em troca de tratá-los como um grupo especial.
Associar judeus ao Diabo e marginalizá-lo foi uma rotina dentro do discurso cristão, inserido na realidade medieval. Não podiam ser senhores, não podiam pertencer ao clero, não podiam ser servos, nem jurar vassalagem. Resumindo eram excluídos da sociedade medieval. Excluídos no campo, a maioria dos judeus foram para as cidades passando a se dedicar ao comércio e ao artesanato. Comercializar passa a ser uma profissão tipicamente judaica. Enriqueceram-se de certo.
No século XIX os judeus, em troca de seus privilégios como grupo a parte, atuaram como financiadores do Estado moderno Europeu. Não formavam uma classe e nem pertenciam a qualquer classe nos países onde viviam. E ao mesmo tempo evitavam serem assimilados a fim de guardarem a sua identidade cultural e religiosa. Uma via de mão dupla, pois, ao mesmo tempo era também de interesse do Estado conservar os judeus como um grupo a parte evitando assim que fossem assimilados pela sociedade de classe.
Esse caráter privilegiado, somado a sua intensa relação com o Estado, somada a sua preferência em se manterem em um círculo fechado familiar foi que fomentou-se o mito de que os judeus controlavam o Estado, logo seus privilégios se explicam. E como grupos restritos e fechados, passaram a ser suspeitos de maquinarem. O banqueiro judeu, em uma sociedade marcada pela profunda contradição do sistema capitalista e a divisão da sociedade em classes, parecia estar explorando não só a mão-de-obra e a capacidade produtiva, mas também a infelicidade e a miséria do proletariado. Era a interpretação da aristocracia.
Os judeus eram vulneráveis e tinham uma ilusão muito grande quanto a sua segurança devido a sua forte relação com o Estado.
HITLER
Como que um homem que fora, em sua juventude, um vagabundo derrotado em Viena, soldado desconhecido da Primeira Guerra Mundial, líder um tanto quanto cômico de um golpe fracassado – Putsh da Cervejaria – , que desprezava os seus professores, queria ser pintor mas fracassara por vezes no exame de admissão da Academia de Belas Artes, repudiava o trabalho regular, evitando assim seguir os paços do pai no funcionalismo público, que não era se quer alemão, era um austríaco, aos 44 anos de idade fazia o juramento como chanceler do Reich alemão e movia as engrenagens que ceifaria milhões de vidas humanas?
Hitler não veio de uma família de história política, mas seu caminho foi marcado por um fanatismo político desenfreado. Era Hitler uma pessoa politizada ou um alienado de marca maior? O homem que fundou o Terceiro Reich, que governou implacavelmente e não raro com uma astúcia incomum como grande orador, conduziu um país e seus habitantes a tão estonteante altura e ao mesmo tempo a um fim tão triste.
Era, indubitavelmente, um gênio, embora que voltado para o mal. Seu fanatismo político na promessa de um futuro melhor, principalmente quanto a sua convicção da pureza de raça, fazia de Hitler um alienado.
O PODER PELA INSTITUCIONALIDADE
Hitler não deu um golpe e tomou a Alemanha de assalto. Chegou ao poder naquele país pelo viés da institucionalidade. A partir da frustrada tentativa de golpe, o Putsh da Cervejaria, Hitler passou a ter a concepção de que a tomada do poder, a revolução propriamente dita, só poderia ser possível pelo viés institucional.
A grande crise do sistema capitalista de 1929 teve um impacto muito forte sobre a Alemanha e Hitler soube muito bem manobrar a crise de modo colocar o povo a seu lado e o nazismo no poder. Hitler demonstrara seu dão como estratego: em 1923 o nazismo não tinha condições e apoio necessário para se chegar ao poder, contudo ao longo do tempo Hitler em suas manobras políticas conseguiu o apoio dos industriais e do exército; em 1929, a conjuntura da crise foi usada para mostrar ao povo alemão que estava sendo seguindo um modelo arruinado e decadente. Assim ao longo do tempo Hitler foi preparando o caminho para o poder pela institucionalidade. Primeiro se alcançaria o poder depois se fazia à revolução.
Uma vez no poder o passo seguinte seria consolidá-lo por um processo de nazificação. E o incêndio do Reichstag – espécie de parlamento – , serviu como um catalisador para a consolidação do poder, embora sua origem seja dúbia, o acontecimento desencadeou uma série de ações que iriam ajudar o nazismo a consolidar o poder:
  • Suspensão das liberdades individuais e civis;
  • Pretensa ameaça de uma revolução comunista;
  • Aprovação do ato que dá a Hitler poderes excepcionais por 4 anos;
  • Fim da federação.

A pesar da intensa propaganda nazista a respeito do risco eminente da tomada do poder pelos comunistas, não havia sinais de uma revolução comunista em ação naquele país. O incêndio do Reichstag demonstra que, embora a modo de se chegar ao poder tenha sido pela via institucional, após a conquista do poder, houve modificações, por vários artifícios com a finalidade de consolidar o poder. A revolução para Hitler passa por uma idéia de evolução. A revolução só se consumaria dentro de uma perspectiva de uma elite racial, é a questão da superioridade de raça ariana.

A VIDA NO TERCEIRO REICH
O povo alemão parecia não perceber ou se importar com a perda de sua liberdade pessoal, de sua cultura ter sido em grande parte destruída e substituída por uma barbárie, ou de sua vida e seu trabalho terem sido regulamentados a um ponto jamais experimentado. O povo alemão parecia não sentir a ditadura e pelo contrário, apoiavam o Reich na esperança de um futuro promissor.
O nazismo mostrou que não visava simples e puramente o controle das instituições, mas também objetivava controlar a vida das pessoas. Era a perda das liberdades individuais por um bem maior.
Os judeus além de expulsos foram transformados em animais: expulsos dos empregos públicos; foram afastados das práticas comerciais e industriais. Encontravam dificuldade e até mesmo impossibilidade de comprar alimentos e medicamentos. Tiveram seus direitos de ir e vir suspensos em estabelecimentos e em algumas cidades.
A nazificação da cultura teve seu maior exemplo quando livros foram queimados no dia 10 de maio de 1933, acusados de serem contrários ao Reich. Foram ainda proibida a venda e a circulação de diversas obras. Foram criadas câmaras com a finalidade de controlar a vida cultural; a arte, a literatura, o rádio, o cinema, e a imprensa deveriam ser controlados e deslocados para realizar propaganda nazista. A cultura alemã entrou em decadência.
A educação no Terceiro Reich, como Hitler pretendia que fosse, não devia ser restringida às salas de aulas abafadas e sim realizadas à maneira espartana: grupos juvenis treinados política e militarmente. Uma educação que não visava transmitir pura e simplesmente o conhecimento. Os jovens foram organizados e postos sob dura disciplina das organizações da juventude do Reich alemão.
As Igrejas Cristãs também foram alvo dos nazistas. Membros e dirigentes católicos foram presos bem como pastores de igrejas protestantes. A perseguição aos protestantes e aos católicos não dividiu o povo alemão. Um povo que havia facilmente perdido a liberdade cultural, política e econômica não iria arriscar sua vida pela liberdade religiosa. O nazismo tencionava substituir as igrejas cristã pelo antigo paganismo dos deuses tribais da Alemanha primitiva e pelo novo paganismo dos extremistas nazistas. Seria criada a Igreja Nacional do Reich. Que não significava apenas um controle da instituição, mas uma invasão às crenças das pessoas. Dentre os seus pontos mais importantes estavam: 1. A Igreja Nacional do Reich da Alemanha afirma categoricamente o direito e o poder exclusivos de controlar todas as igrejas na jurisdição do Reich: declara serem elas as igrejas nacionais do Reich alemão; 5. A Igreja Nacional se dispõe a exterminar irrevogavelmente (…) as crenças cristãs estranhas e estrangeiras trazidas para a Alemanha no malfadado ano de 800; 7. A Igreja Nacional não tem escribas, pastores, capelães ou padres, mas oradores do Reich para falar em seu nome; 8. O ariano Jesus, teria lutado corajosamente para destruir o Judaísmo e teria caído vítima na luta, assim os alemães agora estariam exortados a chegar a serem vencedores na própria luta de Jesus contra os judeus; 14. A Igreja Nacional declara que para ela, e consequentemente, para toda a nação alemã, ficou decidido que Minha Luta, do Führer, é o maior de todos os documentos. Ele (…) não somente contém a maior, mas incorpora a mais pura e verdadeira moral para a vida atual e futura de nossa nação; 18. A Igreja Nacional retirará de seus altares todos os crucifixos, bíblias e santos. Sobre os altares não deve haver nada além de Minha luta (para a nação germânica e, portanto, para Deus o livro mais sagrado) e à esquerda do altar uma espada; 30. No dia de sua fundação a cruz cristã deve ser removida de todas as igrejas, catedrais e capelas e deve ser substituída pelo único símbolo inconquistável – a suástica.
Em meio às condições desesperadoras dos agricultores alemães Hitler tratou de conquistar o apoio deles. A promulgação da lei da fazenda hereditária significou aos camponeses um retrocesso à época feudal. Quanto à recuperação econômica alemã o primeiro passo era fazer o desempregado trabalhar pela expansão das obras públicas. Mas a base real da recuperação econômica da Alemanha fora a indústria bélica. Houve ainda um controle rígido sobre o trabalho e sobre o lazer dos trabalhadores.
O JUDEU E SEU ALGOZ: COMO O MAL PODE SER TÃO BANAL
Primo Levi foi um desses poucos que conseguiram sobreviver à máquina nazista de matar. Em seu livro, “É isto um homem?”, Primo Levi dá muito mais que um depoimento de um sobrevivente dos campos de concentração nazista ele nos trás a tona uma questão muito mais complexa em seu todo: a banalidade do mal. Como que seres humanos, iguais em sua mesma espécie, foram capazes de cometer tal atrocidade? Uma experiência histórica tão cruel nos ajuda em que? As atrocidades foram tais que valeria a pena testemunhar e relembrar o horror de um campo de concentração? Não seria melhor esquecer?
Primo Levi argumenta que o projeto dos campos de concentração tinham por objetivo transformar homens em animais. Desumanizar, acabar com a existência humana.
Há em um todo do livro a preocupação do autor em compreender o ser humano, tanto do seu lado, como judeu, quanto do lado de seu algoz, o nazismo. Os que sobreviveram aos campos de concentração, nos diz o autor, foram aqueles que de alguma forma renunciaram os valores humanos e deixaram a moral ser corrompida. Que existiram bons e maus judeus, os que sobreviveram foram os maus; pois não existe como sobreviver a um campo de concentração sem renunciar a moral e os valores que nos insere na qualidade de seres humanos. Há no autor um sofrimento e uma vergonha por ter sobrevivido. Segundo o mesmo a verdadeira memória dos campos de concentração seria daqueles que morreram.
Hannah Arendt, em um dos clássicos da literatura sobre o nazismo também nos dá importante contribuição para compreender o lado dos nazistas. A autora faz uma análise do julgamento de Eichmann, homem responsável pela deportação dos judeus para os campos de concentração. O julgamento se dá no recém criado Estado de Israel, em 1961, e há toda uma crítica da autora sobre como o julgamento foi conduzido e as suas finalidades políticas.
Para o recém criado Estado de Israel o julgamento era a oportunidade de não somente colocar nos bancos réus um alemão nazista acusado de cometer crimes contra a humanidade, mas também era a oportunidade de fazer do julgamento um exemplo, uma lição para o mundo; uma tentativa de firmação do Estado de Israel como um Estado de justiça. Seria a oportunidade para os judeus colocarem no banco dos réus o próprio anti-semitismo. Todavia, Eichmann, não se enquadrou como o grande vilão da história, tentaram transformar essa figura trágica em um personagem que personificasse o mal, mas o mesmo não se adequou ao papel.
Qual crime Eichmann cometeu? Ele se declarava inocente, pois estava apenas cumprindo ordens, cumprindo as leis de Hitler a ordem vigente de seu país naquele contexto.
A justiça para tal atrocidade então dependeria da perspectiva moral e do ponto de vista de quem está olhando para aquele passado: para Eichmann, dentro da perspectiva e da moral do Terceiro Reich ele era inocente, estava apenas cumprindo as ordens do regime, as ordens de Hitler e o objetivo era bom, era maior.
O que há, de fato, é uma completa inversão de valores para os nazistas eles estavam fazendo o bem, para os judeus eles estavam cometendo um crime contra a humanidade.
Hannah destaca ainda a participação dos próprios judeus na máquina nazista, a exemplo das deportações. Assim quem e o lobo e quem é o cordeiro? Os judeus, eles mesmos, colaboraram – a exemplo delatando famílias em questões locais, entregando o visinho ou auxiliando mesmo na logística e organização do transporte dos seus iguais –  para o próprio extermínio quer seja pela não reação, quer seja pela participação direta e indireta das engrenagens da máquina. Sem a colaboração das próprias vítimas não teria sido possível a matança de tantas pessoas.
No final o julgamento revela uma tragédia que é a questão da inversão total de valores. Mostra que “qualquer um” ser humano pode chegar à condição de genocida em um contexto de efervescência política ideológica.  Os nazistas provocaram muito mais que o colapso na moral da respeitada sociedade europeia. Os judeus foram muito mais do que corpos empilhados, a exemplo do que vemos em fotos preto e branco. Há muito mais peças na engrenagem que move a história, que move o homem e que deve ser compreendida como um todo sem se lançar a mera contradição do maniqueísmo preto e branco; bem e mal. A história do nazismo nos revela essa contradição dos ditos valores humanos: o bem maior nos parece como o mal maior.
Bibliografia
ARENDT,  Hannah. Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal. Tradução de José Rubens  Siqueira. São Paulo: Companhia das Letras, 1999 (1ª ed, norte-americana 1963).
ARENDT, Hannah. O sistema totalitário. Tradução de Roberto Raposo. Lisboa: Dom Quixote, 1978 (1ª ed. Norte americana 1951).
LEVI, Primo. É isto um homem? Tradução de Luigi Del Re. Tio de Janeiro: rocco, 1988 (1 ed. Italiana 1947).
SHIRER, William L. Ascensão e queda do Terceiro Reich. Vol. 1: Triunfo e consolidação (1933 – 1939). Tradução de Pedro Pomar. Rio de Janeiro: Agir, 2008 (1ª ed. Norte-americana 1960).

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Código Florestal Brasileiro uma discussão polarizada: o povo brasileiro está perdido na selva




Por Douglas Barraqui 

“O Brasil não tem povo, tem público”; mais uma vez eu tenho que me deixar concordar com o axioma de Lima Barreto. O substituto do Código Florestal brasileiro, projeto 1.876/99 do deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP), contempla uma polarização da discussão quanto ao destino de nossas florestas. Ao povo brasileiro nada foi apresentado de concreto e assim não se houve o mesmo.

Maior proteção ambiental ou maior produtividade rural? É o “ser ou não ser” que polariza essa discussão sobre o substituto do Código Florestal. De um lado estão os ambientalistas que defendem o aperto do cerco aos ruralistas do mal. De outro está o agrobusiness que levantam a bandeira pelo desenvolvimento do agronegócio no Brasil. Teoricamente o discurso do desenvolvimento sustentável seria o interlocutor capaz de unir ecologistas, ruralistas e a sociedade, só que na prática isso não está ocorrendo.   

A Lei N.º 4.771 de 15 de setembro de 1965, mais conhecida como Novo Código Florestal Brasileiro,  trata das florestas em território brasileiro e demais formas de vegetação, define a Amazônia Legal, os direitos de propriedade e restrições de uso para algumas regiões que compreendem estas formações vegetais e os critérios para supressão e exploração da vegetação nativa. A Lei N.º 4.771 é chamada de “Novo Código Florestal” porque em 1934 já havia sido aprovado o “Código Florestal” (Decreto n.º 23.793) que, no entanto, não deu certo devido às dificuldades para sua implementação. Ao decorrer dos últimos 40 anos essa lei sofreu uma série de intervenções no seu texto original, hora beneficiando ruralistas ora aplaudida por ambientalistas. 

Um estudo Coordenado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e pela Academia Brasileira de Ciências (ABC) apontam para algumas falhas do projeto e como está sendo apresentado não é benefício nem para o meio ambiente e nem para a produção rural e menos ainda para o povo brasileiro. A pesquisa aponta que a proposta de redução das áreas de reserva legal, contida no substitutivo, ampliaria os riscos de extinção de espécies, além de comprometer os serviços ambientais obtidos a partir dessas porções de terra preservadas. A proposta contida no relatório apoiado pelos ruralistas, que prevê a diminuição das áreas de preservação permanente (APPs) às margens de rios e em topos de morro, “representaria grande perda de proteção para áreas sensíveis”, segundo o documento divulgado pelos cientistas. 

 O estudo foi resultado de 10 meses de trabalho de cientistas, professores e pesquisadores de instituições como SBPC, ABC, Inpe, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e diversas universidades.
O projeto do deputado federal Aldo Rebelo é uma tentativa, tida para muitos como bem intencionada, de acabar com a vigência de uma série de legislações introduzidas no texto original de 1965. Todavia, o projeto, em fase de discussão e indo para a votação na Câmara Federal, não foi contemplado pelo povo brasileiro. Minha opinião como cidadão brasileiro e como pesquisador no campo da história ambiental e que esse projeto não deve ser votado enquanto o Governo Federal não fizer, por decreto lei, o Zoneamento-Econômico-ecológico. [1] E antes ainda da população brasileira, após ser apresentado todos os dados, ser ouvida por um referendo.

É óbvia a necessidade de que, antes de preservar, ou, conservar ecologicamente o território do Brasil, há que se conhecer, através do Zoneamento, as áreas que poderão, ou, não, serem preservadas, ou, conservadas. Para não se estancar o aproveitamento econômico das partes férteis do território brasileiro. 

Enquanto a bancada governista, representado pela ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e pelo ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Wagner Rossi, busca a construção de um consenso e tentam um acordo entre as partes, o povo brasileiro permanece letárgico e lançado à morosidade. Fico a torcer para que prevaleça o bom senso embasado em dados científicos e para que a povo brasileiro assista o destino de nossas florestas.  Só assim há de se edificar um caminho sustentável propriamente dito.

 Nota:
[1] O Zoneamento Econômico Ecológico é um instrumento da Política Nacional de Meio Ambiente, de âmbito territorial, que subsidia o governo com bases técnicas para definir os diversos usos do território, de forma a promover o desenvolvimento sustentável e ordenado, combinando crescimento econômico com equilíbrio ambiental. O ZEE orienta os planos de ordenamento territorial, que definem, por exemplo, que atividade (agricultura, indústria etc.). 

Bibliografias Consultadas:
AHRENS, Sergio. O novo Código Florestal Brasileiro. Disponível em. Acesso em 02 de maio de 11.