quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

O Humanismo Cívico em Baron e em Skinner

Por Douglas Barraqui

“Liberdade, igualdade, fraternidade, individualismo, racionalismo”; Os alicerces da nossa sociedade foram construídos sobre os valores renascentistas, estes por sua vez buscaram entre gregos e romanos sua inspiração. Um desse legados é o “Humanismo Cívico”. Neste breve texto iremos abordar dois autores e o debate que eles fazem a cerca do “Humanismo Cívico” ou “Republicanismo Clássico”: Quentin Skinner, historiador Britânico, e Hans Baron historiador alemão que pesquisou o pensamento político e literatura no Renascimento italiano - sua principal contribuição para a historiografia do período foi a introdução, em 1928, o termo humanismo cívico.

E o que seria o “Humanismo Cívico” ou, como preferem alguns autores, “Republicanismo Clássico”? é a doutrina segundo a qual a verdadeira natureza do homem se realiza no engajamento da vida política. Ele tende a ver a vida moderna como uma degeneração da vida humana, porque está concentrada demais nas idéias de interesse particular e felicidade individual. Para o “civista”, a verdadeira república é vivida onde os homens se entendem como cidadãos antes que como indivíduos, onde se consideram livres quando participam da tomada de decisões, e não quando são menos coagidos por elas. Trata-se, portanto, “de uma nova filosofia de engajamento político e da vida ativa”; pautada pelo exercício da prática da vida cívica (vida pública) e da valorização da vida ativa. Assim, o “Humanismo Cívico” ou “Republicanismo Clássico” passou a ser um modelo de interpretação da história do pensamento político moderno.

Trata-se de uma tese de Hans Baron, importante historiador do século XX. Para Baron Florença, no contexto do Renascimento, será o centro difusor da Itália e para o mundo do que Baron chamou de “Humanismo Cívico”. Para Baron o “Humanismo Cívico” é uma característica singular da Florença renascentista e que de Florença se irradiou para outros lugares.
Hans Baron

Baron considera que o desenvolvimento do “Humanismo Cívico” tem relação direta com a luta por “liberdade cívica” que os florentinos foram forçados a travar, na primeira metade do século XV, contra Giangaleazzo Visconti, o duque de Milão, quando este declarou guerra a Florença. E quando Giangaleazzo morre em 1402 pela peste – o que salvou Florença da derrota, considerado por alguns como milagre – seu filho, o duque Filippo Maria Visconti de Milão assumira os objetivos do pai. A guerra durou até 1454 quando Cosme de Médici consegue negociar a paz.

Os acontecimentos acima relatados foram utilizados por Baron para pontuar o surgimento do “Humanismo Cívico”. Para isso irá se utilizar de uma série de autores que discutiram as questões políticas em Florença no início do quatrocentos. A “postura solidária” que Florença tomou frente aos déspotas que ameaçavam a sua soberania é interpretada por Baron como catalisadora de uma nova consciência e mais intensa da vida pública: um novo tipo de humanismo pautado pela devoção das liberdades coletivas e uma nova política de engajamento da vida ativa política.

Em Baron o “Humanismo Cívico” é uma resposta a crise de Florença. Em meio a ameaça a independência de Florença irá ocorrer uma maior valorização dos valores republicanos. Basicamente uma relação de causa e efeito: ameaça a Florença/surgimento do “Humanismo Cívico”.

Quentin Skinner, historiador Britânico, não contesta ou questiona o “Humanismo Cívico”. O que ele pondera é que os valores do “Humanismo Cívico” – engajamento da vida política, a vida ativa e a defesa dos valores republicanos – não é algo exclusivo de Florença.
Quentin Skinner

Para Skinner o “Humanismo Cívico” já era embrionário nos surgimentos das Cidades Estados italianas no confronto com o Sacro Império no século XII e no conflito com os papas no século XIV. Neste contexto, ainda na Idade Média,  vários autores já conclamavam a defesa dos valores republicanos como justificativa ideológica para legitimar o enfrentamento dos adversários de Florença que ameaçavam a sua liberdade. Dentre eles Marsílio de Pádua, que em seu texto, “o defensor da paz”, defendeu o republicanismo e a soberania popular.
Skinner pontua também o que há de original e exclusivo em Florença quanto à caracterização do “Humanismo Cívico”:

  • Defesa da República como melhor forma de governo: Baron diz que Salutati havia sido o primeiro a afirmar a República como melhor forma de governo. Skinner por sua vez diz que tanto Bartolommeo quanto Marcílio já haviam feito isso.
  • Noção de liberdade republicana: relacionada desde Aristóteles a Rousseau a idéia de autogoverno e independência.
  • Faccionismo ou partidarismo: a este ponto desta Skinner que não foi dado grande importância por autores florentinos pois ali não havia conflitos de facções.
  • Riqueza excessiva: a República atua como limitadora da riqueza excessiva.
  • Tropas mercenárias: não aparece na literatura medieval mas, Leonardo Bruni irá condenar pois estes mercenários não lutavam pelos valores da República e sim pelo butin e/ou pelos seus soldos.
Assim podemos perceber que Baron não percebeu a relação entre o “Humanismo Cívico” florentino e as tradições medievais. Baron exaltou Florença e seu exclusivismo no surgimento dos valores do “Humanismo Cívico”, porém, Skinner vai nos dizer que estes valores surgem bem antes, ainda na Idade Média. Skinner ainda destaca o elemento de continuidade para contestar as idéias de Baron.

Podemos dizer que do “Humanismo Cívico” será feita uma releitura no século XVIII na  Revolução Inglesa e na Revolução Francesa. E que essa teoria é um marco no entendimento do pensamento político moderno. 

Referências:

SKINNER, Quentin. A formação do pensamento político moderno. São Paulo, Companhia das Letras, 1996. 




2 comentários:

Unknown disse...

Bela explicação, elucidou bastantes pontos divergentes entre os autores. Agora espero tirar uma boa nota em História das Relações Internacionais na Idade Moderna.

Anônimo disse...

Muito obrigado pelo texto!! Me ajudou muito com a minha cadeira de História Moderna I.